27 de abril de 2006

”L’Enfant” por António Reis



O grande vencedor do festival de Cannes de 2005 dos irmãos Dardenne vai finalmente estrear em Portugal, quase com um ano de atraso. Não surpreende que o júri tenha sido sensível a esta história de adolescência marginal e conturbada, mas onde não falta a esperança de uma redenção.
Apesar de um estilo próximo da docuficção “L’Enfant” afasta-se do documental típico e até do estilo tradicional dos Dardenne. Quem viu “Pleasant Days” no último Fantasporto acaba por encontrar entre os dois filmes imensas semelhanças nas temáticas, nos personagens e até nas soluções.
Um casal de adolescentes acaba de ter uma criança. Entre o instinto maternal que se desenvolve em Sonia e a oportunidade de um negócio de venda da criança que se coloca a Bruno (o seu namorado) o filme vai narrando com grande economia emotiva mas com sinceridade e realismo o drama de casais adolescentes. Os Dardenne não resistiram a transformar um caso de polícia numa parábola moral onde o amor e a esperança prometem triunfar sobre a delinquência.
Para que subsistam dúvidas é um filme interessante, narrativamente sem falhas, estilisticamente muito cuidado. Cannes dificilmente poderia resistir a premiar um filme francófono e sobretudo de aproveitar a oportunidade para premiar os Dardenne. No equilíbrio de forças e de lobbys em que os prémios sempre se envolvem “L’Enfant” merece a boa palma.



Título Original: "L’Enfant" (Bélgica,França 2005)
Realização: Jean-Pierre Dardenne, Luc Dardenne
Intérpretes: Jérémie Renier, Déborah François, Jérémie Segard
Argumento: Jean-Pierre Dardenne, Luc Dardenne
Fotografia: Alain Marcoen
Género: Drama
Duração: 100 min.
Sítio Oficial: http://www.zeusfilm.com/thechild

24 de abril de 2006

”Inside Man” por António Reis


Um golpe mais que perfeito
Inside Man” é um magnífico exercício de estilo sobre o policial, mesmo que seja sobre a mais inverosímil história de um assalto.
Tudo na história é improvável: o negociador parece um dandy de fato branco e panamá, o dono do banco (Christopher Plummer) é um inimaginável banqueiro de consciência pouco limpa, Jodie Foster é uma negociadora inconsistente, o mestre do crime tem a imaginação mais prodigiosa e delirante desde Danny Ocean. Transformar um assalto a um banco no coração de Manhattan com tomada de reféns, onde não se rouba dinheiro, não se pretende negociar, não se distinguem os assaltantes dos clientes, não é o modelo convencional de um assalto. Nesta anatomia de um crime falta o essencial, ou seja, o crime. Com estes ingredientes Spike Lee faz um dos seus mais brilhantes filmes, demonstrando a sua mestria na comédia policial, ainda que se afaste das suas temáticas tradicionais e do seu humor um pouco “negro”. Uma banda sonora étnica deslumbrante, uma fotografia em tom sépia e cinza de uma qualidade extrema, fazem de “Inside Man” uma das melhores comédias do ano. Para acalmar os puristas do género o desenlace do filme, completamente impossível mas de uma imprevisibilidade absoluta, faz entrar nos eixos o policial. O roubo serve-se frio, como queria Hitchcock, os maus se não são castigados são pelo menos amedrontados, os polícias quando não são corruptos deixam-se tentar por um pequeno anel de diamantes, os mastermind do golpe são recompensados pelo seu engenho. Quem viu o filme seguramente que recordará com ironia a irresistível cena do discurso de Enver Hodja, uma das tiradas mais geniais de todo o filme, um gag digno de emparceirar com os melhores de Woody Allen. Por isto tudo merece seis estrelas em cinco possíveis, sendo a estrela excedentária pelo humor que bem falta anda a fazer no cinema americano.



Título Original: "Inside Man" (EUA, 2006)
Realização: Spike Lee
Intérpretes: Denzel Washington, Clive Owen, Jodie Foster, Christopher Plummer, Willem Dafoe
Argumento: Russell Gewirtz
Fotografia: Matthew Libatique
Música: Terence Blanchard e A.R. Rahman
Género: Acção/Comédia/Policial
Duração: 129 min.
Sítio Oficial: http://theinsideman.net/

20 de abril de 2006

Pedro Costa na Selecção oficial da 59ª edição do Festival de Cinema de Cannes


Juventude em Marcha escrito e realizado por Pedro Costa foi seleccionado para integrar a selecção oficial da 59ª edição do Festival Internacional de Cinema de Cannes que decorre entre os próximos dias 17 e 28 de Maio.
Juventude em Marcha é o mais recente filme do realizador lisboeta de 47 anos. Em 2000 Pedro Costa ganhou o France Culture Award neste festival com o filme No Quarto da Vanda. Contudo, o seu mais conhecido filme data de 1997: Ossos, distinguido no Festival de Cinema de Veneza com o Prémio Golden Osella.
Da selecção oficial da 59ª edição fazem parte filmes como Volver de Pedro Almodóvar, Maria-Antoinette de Sofia Coppola, El Laberinto del Fauno de Guillermo Del Toro, Babel de Alejandro Gonzaléz Iñárritu, Southland Tales de Richard Kelly, The Winds that Shakes the Barley de Ken Loach e Il Caimano de Nani Moretti, entre outros.
A abrir o Festival de Cinema de Cannes vai estar o mais recente filme de Ron Howard The Da Vinci Code.

César Nóbrega


10 de abril de 2006

FEST 2006


Começou ontem no Centro Multimeios, em Espinho, a 3ª Edição do FEST - Festival de Cinema e Vídeo Jovem de Espinho, com a exibição em antestreia de "Half Light", com Demi Moore no principal papel. Com 19 sessões competitivas e 124 filmes a concurso, o certame conta ainda com a exibição de vários filmes em antestreia, bem como encontros com realizadores, produtores e actores, alguns dos quais irão leccional master classess sobre variados assuntos. Vale, indubitavelmente uma(s) visita(s) a Espinho, quer pelas sessões cinematográficas, quer pelo fantástico ambiente que rodeia todo o festival. Para mais informações, www.fest.pt.


6 de abril de 2006

"Basic Instinct 2" por Nuno Reis

Sharon Stone pode ter sido nomeada para um Óscar por “Casino” mas a resumir a carreira a um filme ele seria “Basic Instinct”. É incrível como um simples descruzar de pernas pode marcar toda uma carreira. Mais de dez anos depois foi feito um esforço para criar um remake digno do original, Michael Caton-Jones realizou, Charlotte Rampling é uma das secundárias e o argumento é dos autores de “Venus Rising”. Sharon Stone voltou por quase 20 vezes mais do que recebeu no original (subiu de 750000 para treze milhões e meio). O resultado? Uma desilusão pior do que o esperado.

A história volta a seguir Catherine Tramell, uma sedutora psicopata que mata impunemente apenas pela emoção. A vítima da intriga volta a ser um polícia mas desta vez o protagonismo é assumido por um psicanalista (David Morrisey). O filme começa com Catherine a ter relações num carro que se afunda, nesse acidente morre um famoso futebolista o que a lança num rodopio de mediatismo coincidente com as suas ambições. Michael Glass é o homem indicado pelo Ministério para traçar o perfil dela e determinar se pode sair em liberdade. Como todos antes dele também o doutor acabará por se apaixonar e cair numa trama de sentidos que o levará a ser acusado dos crimes que ela comete.

Stone tem um bom papel e mais uma vez encaixa na personagem como ninguém. Apesar dos cinquenta anos continua a ser deslumbrante e não tem nada de que se envergonhar nas variadas cenas de nudismo. O resto do filme tenta afastar-se dela e mostrar o drama de Michael mas cai em vários lugares comuns e repete tudo aquilo que foi visto em demasiados filmes. É um título para esquecer.




Título Original: "Basic Instinct 2" (EUA, 2005)
Realização: Michael Caton-Jones
Intérpretes: Sharon Stone, David Morrissey, Charlotte Rampling
Argumento: Leora Barish e Henry Bean
Fotografia: Gyula Pados
Música: John Murphy, Jerry Goldsmith
Género: Crime/Drama/Thriller
Duração: 114 min.
Sítio Oficial: Basic Instinct 2

3 de abril de 2006

"V for Vendetta" por Nuno Reis


Com a chegada das férias começam a estrear por cá alguns dos blockbusters que já causaram sensação um pouco por todo o mundo. Hoje o destaque vai para “V for Vendetta”, um filme futurista que alerta para os perigos escondidos na actualidade. A sociedade desta nova Inglaterra foi inspirada na Alemanha dos anos 30. Também aqui os não cristãos, os homossexuais e os revolucionários da oposição são exterminados, a normalidade é a necessidade absoluta e o Chanceler tudo fará para a conseguir.

O super-herói desta banda desenhada escapa ao normal. O (anti-)herói da história é V, um homem misterioso que usa sempre máscara, é imune às balas e move-se com uma velocidade estonteante. Em tudo o resto não se parece com um herói pois não tem identidade secreta e é capaz de fazer tudo, sem sentir remorsos… Como nenhum homem poderia combater o sistema, essa tarefa é assumida por um ideal, V não é um humano, é a encarnação desse ideal.

Cinco de Novembro é a data fulcral. V anuncia com um ano de antecedência que pretende fazer explodir o Parlamento exactamente no mesmo dia em que Guy Fawkes o tentou e usando sempre uma máscara desse revolucionário vai matando alvos seleccionados. Enquanto isso Fich, o inspector encarregado de o capturar, em busca da identidade de V vai juntando as peças do passado e percebe que algo de errado foi escondido em relação aos atentados perpetrados por terroristas vinte anos antes que levaram às rápidas transformação político-sociais. Teria o governo sido capaz de realizar um ataque contra o seu próprio povo para levar as pessoas a odiar e a combater? Não foi isso insinuado em relação à tragédia do 9/11? Uma sociedade tão facilmente comparável à de “1984” e porém tão igual ao mundo em que vivemos. O medo do terrorismo e a paranóia da segurança levou os governos a limitarem ao máximo a liberdade do indivíduo. A obra de Orwell era mais ficcionada e esta é menos extremista, contudo leva-nos a pensar aquilo para que nos dirigimos.
Este filme como blockbuster assumido de raiz, prima pelo elenco reunido. Argumento dos irmãos Wachowski baseados numa BD da DC Comics, o protagonismo foi entregue à oscarizada Natalie Portman e a Hugo Weaving (que nunca mostra a cara), como vilão de serviço o incomparável John Hurt e ainda participações de Stephen Rea e Tim Pigott-Smith.
Como drama e filme de acção está bom, como ficção está assustadoramente credível. Tem alguns momentos irreais mas tem também muitos daqueles tão bem feitos que dão vontade de rever o filme ainda antes de ter acabado. Sobra a moral do filme: as massas são facilmente controláveis, tanto pelo bem como pelo mal, quem controlar o povo controla o país.





Título Original: "V for Vendetta" (EUA, 2005)
Realização: James McTeigue
Intérpretes: Natalie Portman, Hugo Weaving, Stephen Rea, John Hurt
Argumento: Irmãos Wachowski
Fotografia: Adrian Biddle
Música: Dario Marianelli
Género: Acção/Drama/Thriller
Duração: 132 min.
Sítio Oficial: http://vforvendetta.warnerbros.com/

2 de abril de 2006

”Underworld: Evolution” por Nuno Reis



Há três anos Kate Beckinsale entrou em grande nos blockbusters do cinema fantástico com “Underworld”, “Van Helsing veio meses depois. Enquanto no primeiro a luta era entre vampiros e lobisomens, o segundo recuperava o mais clássico caçador de vampiros colocava-o a enfrentar essas duas criaturas e ainda Frankenstein, a elíte do terror.
Por enquanto não se lembraram de fazer uma sequela de “Val Helsing”, ou pelo menos não a filmaram ainda, mas este ano chegou às salas a sequela de “Underworld” com o sugestivo título “Evolution”. Na primeira parte Selene tinha sido traída pelos seus mas tinha-se vingado e criado um híbrido. Meio vampiro meio lobisomem, Michael seria a criatura mais poderosa à face da terra. Em “Underworld: Evolution” seria suposto que houvesse evolução, se não nas personagens pelo menos na história. O filme começa com Michael a adaptar-se a ser híbrido e controlar o seu desejo de alimento, depois é apenas violência gratuita num argumento demasiado pobre para merecer a película que foi gasta. Os confrontos entre monstros foram transformados em algo ridículo, o primeiro filme tinha alguma emoção e causaria alguns sustos, este não tem emoção e causa sono. As criaturas e a sua monstruosidade foram reduzidas ao mínimo, o filme anterior tinha vampiros e lobisomens com muitas transformações e elaboradas técnicas de caracterização e computação, neste é exactamente o contrário. Aqui Beckinsale é um híbrido mas a caracterização resume-se a lentes de contacto, os combates corpo-a-corpo são entre actores, os CGI apenas são alvejados de longe.
A nível de conhecimento do passado tentam corrigir a versão apresentada em “Underworld”, acrescentam nomes, mostram as origens e tentam encaixar tudo. O resultado é uma amálgama que vem destruir a impressão causado pelo primeiro filme. É triste dizer mas este filme se fosse uma luta entre pessoas normais seria considerado dos piores de sempre, só por ter uns monstrinhos já milhões o irão ver. Isto não é cinema fantástico, é mau cinema de acção.



Título Original: "Underworld: Evolution" (EUA, 2006)
Realização: Len Wiseman
Intérpretes: Kate Beckinsale, Scott Speedman, Tonu Curran
Argumento: Danny McBride, Len Wiseman, Danny McBride
Fotografia: Simon Duggan
Música: Marco Beltrami
Género: Acção/Fantasia
Duração: 106 min.
Sítio Oficial: Underworld: Evolution/

1 de abril de 2006

”Bandidas” por Nuno Reis



Bandidas” é uma versão feminina e cómica de algo entre Zorro e Zapata e com um pouco de “Once Upon a Time in the West”. Esta comparação pode ser estranha mas o que se passa no filme não poderia ser mais parecido. A história desenrola-se no México, há mais de um século atrás. Uma jovem da terra revoltada contra os bancos estrangeiros que lhe destroem o lar decide vingar-se fazendo assaltos. E uma jovem acabada de chegar da Europa, onde viveu toda a sua juventude, impõe-se contra o que vê acontecer na sua pátria e para se vingar dos culpados decide atacá-los onde pode, os bancos. Esta dupla tenta assaltar o mesmo banco ao mesmo tempo e isso leva-as a desmascararem-se e a formarem equipa, uma muito improvável equipa onde os soluços e as zaragatas são diárias. Treinadas por um homem misterioso irão tornar-se a maior ameaça para o projecto de caminho-de-ferro dos invasores e a única esperança de um povo que perdeu tudo.

Salma Hayek e Penélope Cruz são amigas de longa data, é curioso que este seja o primeiro filme que fazem juntas e que interpretem rivais. É também curioso que a mexicana interprete uma jovem que educação europeia e a espanhola interprete uma mexicana, mas atendendo ao perfil de cada uma isso tem toda a lógica. Cruz é mais selvagem do que Hayek, não seria fácil considerar a personagem europeia como educada em comparação com a rapariga da terra. Steve Zahn foi o escolhido para interpretar o agente da autoridade destacado para deslindar os assaltos da dupla. Ele trabalhou com Cruz ainda o ano passado (em “Sahara”) e com Hayek em 2000 ("Chain of Fools"). É notória a diferença de importância entre as personagens, é um outsider num filme de amigas e sabe-o bem.

O filme poderia ter sido melhor e sabe a pouco. Em paródias do western está próximo de “Wild Wild West”, filme que o intrincado método científico policial tenta recordar. Como comédia não é genial mas vai mantendo o interesse até ao final, personagens típicas, piadas velhas, tudo o que seria de esperar num filme destes está presente.



Título Original: "Bandidas" (EUA, França, México, 2006)
Realização: Joachim Roenning e Espen Sandberg
Intérpretes: Penélope Cruz, Salma Hayek, Steve Zahn
Argumento: Luc Besson e Robert Mark Kamen
Fotografia: Thierry Arbogast
Música: Frédéric Thoraval
Género: Comédia/Western
Duração: 93 min.
Sítio Oficial: http://www.bandidas-lefilm.com/