12 de julho de 2010

"Dial M for Murder" por Nuno Reis

Há uns poucos filmes que dispensam apresentações. Quando o título é precedido por “Alfred Hitchcock’s” sabemos que estamos perante uma obra-prima e que em muitos casos o resto do título é inolvidável por si só. “Dial M for Murder” pertence a essa galeria ilustre do cinema.

Tony (Ray Milland) é um tenista reformado que casou por dinheiro com Margot (Grace Kelly). Numa tentativa de se livrar dela, planeia o crime perfeito durante meses. Quando chega a hora e o assassino falha, vai ter de improvisar, mas parece que até nisso tem sorte. O competente Inspector Chefe Hubbard (John Williams) prende Margot como suspeita de homicídio. A única hipótese de Margot reside em Mark (Robert Cummings), o seu amante autor de policiais terá de descobrir a verdade, ou inventar uma história plausível para a salvar da pena de mote.

Adaptado de uma peça de Frederick Knott, estamos perante aquele que é o filme perfeito sobre o crime perfeito. Por ter raízes teatrais desenrola-se num cenário essencialmente limitado a uma sala (tirando a casa e a entrada da casa, apenas dois cenários são usados, o teatro e ) e a trama envolve apenas cinco personagens, a dificuldade do argumento estava em tornar isso emocionante. A realização de Hitchcock basta para fazer qualquer coisa melhor, mas com estas bases construiu um exemplar monumental do que é o Cinema. Romance, crime, drama, mistério, thriller, que género não entra neste trabalho? Misturando todos os géneros que o fizeram grande, Hitchcock deixa marcas do seu estilo em tudo. Começa por fazer parte do cenário principal sem que seja visto. Recheia o filme com twists, disfarça diálogos enormes com humor e sageza, torna uma grande peça de teato num clássico do cinema.

Para facilitar a migração do efémero teatro para a eternidade da fita, os actores John Williams (Inspector Hubbard) e Anthony Dawson (Lesgate, o assassino contratado) foram trazidos da Broadway dentro das suas personagens. A eles juntou-se o esquecido Ray Milland. Apesar de ter sido multi-premiado (Oscar, Globe, Palma) em 1946 por “The Lost Weekend” de Billy Wilder, só em “Dial M” voltou à ribalta. O marido ciumento a que dá corpo é um dos vilões mais acarinhados da história do Cinema. Pela inteligência, planeamento e cuidado queremos que tenha sucesso no seu crime, porque o merece.
Por outro lado a vítima não é outra senão Grace Kelly, uma das mais belas e talentosas actrizes de que há memória. Uma loira nas mãos do Mestre está destinada à grandeza e esta não foi uma excepção, foi ainda maior que as outras (Tippi Hedren, Kim Novak...) tornando-se uma rainha por mérito próprio antes de ser princesa consorte do Mónaco. Também não queremos que Margot morra. Apesar de ser infiel mostra ter personalidade e vontade própria e, considerando que ou ela ou o marido receberão a pena de morte, é justo que seja ele.
Hubbard é daqueles polícias que ficam na memória colectiva que é o Cinema. Perfeitamente capaz e incrivelmente observador, se a verdade lhe escapa é porque também o assassino merece escapar. Grande John Williams que fez a carreira longe do cinema, apesar de ter bisado as colaborações tanto com Hitchcock como com Wilder, donos e senhores incontestados do cinema na época.


Dial M For Murder” é uma obra muito bem pensada e que chega ao espectador com uma aparência muito simples.Tirando as chaves que andam de mão em mão nada mais obriga a pensar, apenas a ver e saborear, ou impotente perante o desenrolar de uma injustiça, ou aplaudindo um crime perfeito. O 3D utilizado por Hitchcock teve o azar de chegar numa época em que a tecnologia estava em desuso. Seria uma forma de distrair o espectador de um cenário fechado, mas era perfeitamente dispensável. O filme não precisa desses artifícios. Por outro lado, é um filme 3D em que a tecnologia não é usada para atirar coisas na direcção do público, o que distingue o cinema-espectáculo do cinema-arte. Independentemente das dimensões, é daqueles filmes para ver com urgência, como qualquer obra de Hitchcock.


Título Original: "Dial M for Murder" (EUA, 1954)
Realização: Alfred Hitchcock
Argumento: Frederick Knott
Intérpretes: Ray Milland, Grace Kelly, John Williams, Robert Cummings
Fotografia: Robert Burks
Música: Dimitri Tiomkin
Género: Crime, Mystério, Thriller
Duração: 105 min.

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