A pirataria é um mal que paira sobre a Humanidade. Todas as semanas, navios de praticamente todas as nacionalidades correm grandes riscos de serem abordados por piratas somalis nos Mares Arábico e Índico. Enquanto isso é um atentado à integridade física de pessoas e um roubo de produtos físicos - e a também antiga contrafacção de artigos coloca em risco a vida ou a saúde das pessoas - os governos e entidades mais ou menos oficiais preocupam-se principalmente com um tipo de pirataria bem mais ofensivo ou perigoso: a democratização do conhecimento cultural, através da partilha de conteúdos digitais.
Os conteúdos digitais foram uma invenção da indústria. Dando variedade de formatos e portabilidade, tencionavam vender mais, mais depressa e com maior lucro. E tal como no tempo dos gravadores de VHS, os consumidores contornaram as regras. Se há vinte anos as revistas apoiavam o consumidor fornecendo capas e códigos para gravar à hora certa, agora são os próprios fornecedores de serviços televisivos a permitir a gravação e visionamento posterior com um mínimo de esforço. E isso é legal porque, apesar de os fabricantes de conteúdo não gostarem, como são empresas que o fazem pagam impostos, continua a ser negócio. Os consumidores agradecem o serviço prestado.
Vender DVD contrafeitos é ilegal. Porque nesse cenário não ganha quem faz o conteúdo, nem quem o vende paga impostos sobre o seu trabalho. O consumidor agradece pagar menos do que por um bilhete de cinema ou uma cópia oficial e, como os tempos estão difíceis, já sente que é justo cortar numa despesa “supérflua” como é o entretenimento.
Disponibilizar conteúdos online equivale ao anterior porque, atingindo determinada escala, começa a arrecadar quantias consideráveis de dinheiro com a publicidade.
E se quem os coloca online não estiver a ter lucro, nem a roubar a ninguém? Esse era o caso do blog My One Thousand Movies. Os três mil filmes que tinha eram clássicos que não se encontram à venda nem passam na televisão. Pretendiam dar a conhecer o património cinematográfico da humanidade. Serviam para descobrir cineastas esquecidos e obras de culto, mas com pouca resolução para que ninguém se sentisse tentado a ficar com essa versão em vez de se dedicar a procurar no mercado convencional de importação uma versão melhor. Outra vantagem é que no My One Thousand Movies todos os filmes tinham legendas em português ou numa língua mais ou menos compreensível. Na importação não.
Dia 16 de Dezembro foi fechado pela Google sem qualquer aviso por incentivo à pirataria. Estamos a falar de filmes quase impossíveis de encontrar no mercado, que em nada rivalizavam com a versão comprada, se existisse uma, e que tinham no máximo uma centena de downloads provenientes de todo o mundo, não apenas de Portugal.
O que o My One Thousand Movies fazia era complementar (ou substituir) a missão da deficiente televisão pública de educar cinéfilos. Muitos bloggers recorreram a este repositório para rever um título acarinhado, ou, a partir do filme e da pequena resenha que o acompanhava, fazerem publicações com as quais muitas outras centenas de pessoas ficaram com vontade de descobrir um cinema marginal e esquecido.
Isto não é pirataria, é serviço público, e é preciso (re)definir o enquadramento legal adequado.
Se alguém errou no meio disto tudo foram as distribuidoras que não viram interesse em comercializar os filmes. Ninguém o pode ver porque não compensa comprar os direitos e fabricar para pouca gente? Sugeríamos que houvesse um videoclube online no qual, por um valor simbólico, se pudesse ver o filme contribuindo para a distribuidora.
A distribuidora não teria encargos com a manufactura de cópias físicas que ficariam a ocupar espaço em armazém.
Os consumidores exigentes encontrariam o que queriam imediatamente sem remexer em caixotes de promoções nas superfícies comerciais.
Os retalhistas não estão interessados em ter uma cópia única de milhares de filmes que poderão nunca vir a comercializar, mas estariam interessados em vender cartões pré-pagos de acesso a esse serviço, como fazem para as consolas.
Se o preço fosse suficientemente baixo toda a gente poderia espreitar e talvez descobrir algo único.
Enquanto este tipo de serviço não existir, estaremos sempre dependentes da boa vontade, dedicação e cultura de pessoas como o autor do MOTM. Mesmo que achem que isso vai contra a lei. De todos nós, obrigado.
Signatários
Ana Sofia Santos Cine31 / Girl on Film
André Azevedo BD no Sótão
André Marques Blockusters
António Tavares de Figueiredo Matinée Portuense
Armindo Paulo Ferreira Ecos Imprevistos
David Martins Cine31
Eduardo Luís Rodrigues EddyR Corner
Francisco Rocha My Two Thousand Movies
Gabriel Martins Alternative Prison
Inês Moreira Santos Hoje Vi(vi) um filme / Espalha-Factos
Johnny Kino O Desconhecido do Norte Expresso
Jorge Rodrigues Dial P for Popcorn
Jorge Teixeira Caminho Largo
Luís Mendonça CINEdrio
Manuel Reis Cenas Aleatórias / TV Dependente
Miguel Lourenço Pereira Cinema
Miguel Reis Cinema Notebook
Nuno Reis Antestreia
Pedro Afonso Laxante Cultural
Rita Santos Not a Film Critic
Samuel Andrade Keyzer Soze's Place / O Síndroma do Vinagre
Victor Afonso O Homem que Sabia Demasiado
Os conteúdos digitais foram uma invenção da indústria. Dando variedade de formatos e portabilidade, tencionavam vender mais, mais depressa e com maior lucro. E tal como no tempo dos gravadores de VHS, os consumidores contornaram as regras. Se há vinte anos as revistas apoiavam o consumidor fornecendo capas e códigos para gravar à hora certa, agora são os próprios fornecedores de serviços televisivos a permitir a gravação e visionamento posterior com um mínimo de esforço. E isso é legal porque, apesar de os fabricantes de conteúdo não gostarem, como são empresas que o fazem pagam impostos, continua a ser negócio. Os consumidores agradecem o serviço prestado.
Vender DVD contrafeitos é ilegal. Porque nesse cenário não ganha quem faz o conteúdo, nem quem o vende paga impostos sobre o seu trabalho. O consumidor agradece pagar menos do que por um bilhete de cinema ou uma cópia oficial e, como os tempos estão difíceis, já sente que é justo cortar numa despesa “supérflua” como é o entretenimento.
Disponibilizar conteúdos online equivale ao anterior porque, atingindo determinada escala, começa a arrecadar quantias consideráveis de dinheiro com a publicidade.
E se quem os coloca online não estiver a ter lucro, nem a roubar a ninguém? Esse era o caso do blog My One Thousand Movies. Os três mil filmes que tinha eram clássicos que não se encontram à venda nem passam na televisão. Pretendiam dar a conhecer o património cinematográfico da humanidade. Serviam para descobrir cineastas esquecidos e obras de culto, mas com pouca resolução para que ninguém se sentisse tentado a ficar com essa versão em vez de se dedicar a procurar no mercado convencional de importação uma versão melhor. Outra vantagem é que no My One Thousand Movies todos os filmes tinham legendas em português ou numa língua mais ou menos compreensível. Na importação não.
Dia 16 de Dezembro foi fechado pela Google sem qualquer aviso por incentivo à pirataria. Estamos a falar de filmes quase impossíveis de encontrar no mercado, que em nada rivalizavam com a versão comprada, se existisse uma, e que tinham no máximo uma centena de downloads provenientes de todo o mundo, não apenas de Portugal.
O que o My One Thousand Movies fazia era complementar (ou substituir) a missão da deficiente televisão pública de educar cinéfilos. Muitos bloggers recorreram a este repositório para rever um título acarinhado, ou, a partir do filme e da pequena resenha que o acompanhava, fazerem publicações com as quais muitas outras centenas de pessoas ficaram com vontade de descobrir um cinema marginal e esquecido.
Isto não é pirataria, é serviço público, e é preciso (re)definir o enquadramento legal adequado.
Se alguém errou no meio disto tudo foram as distribuidoras que não viram interesse em comercializar os filmes. Ninguém o pode ver porque não compensa comprar os direitos e fabricar para pouca gente? Sugeríamos que houvesse um videoclube online no qual, por um valor simbólico, se pudesse ver o filme contribuindo para a distribuidora.
A distribuidora não teria encargos com a manufactura de cópias físicas que ficariam a ocupar espaço em armazém.
Os consumidores exigentes encontrariam o que queriam imediatamente sem remexer em caixotes de promoções nas superfícies comerciais.
Os retalhistas não estão interessados em ter uma cópia única de milhares de filmes que poderão nunca vir a comercializar, mas estariam interessados em vender cartões pré-pagos de acesso a esse serviço, como fazem para as consolas.
Se o preço fosse suficientemente baixo toda a gente poderia espreitar e talvez descobrir algo único.
Enquanto este tipo de serviço não existir, estaremos sempre dependentes da boa vontade, dedicação e cultura de pessoas como o autor do MOTM. Mesmo que achem que isso vai contra a lei. De todos nós, obrigado.
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André Azevedo BD no Sótão
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António Tavares de Figueiredo Matinée Portuense
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2 comentários:
o problema não é ir contra a lei nem blogar sobre filmes. o problema é que estamos a nos apropriar e distribuir um conteúdo que não é nosso. simples! não é nosso. eu posso fotocopiar o expresso e oferece lo a toda a gente? aliás eu acho o expresso muito caro e conheço pessoas que acham o mesmo. porque não posso fotocópia lo? e livros? 20 euros por um livro? também vou fotocópia los e oferecer. ser ilegal ou legal não é o mais relevante. o relevante é se é justo ou não!
Podem ter ocorrido alguns casos de filmes erradamente seleccionados para aquele blog, mas a enorme maioria eram filmes que não se encontravam comercializados em Portugal porque nenhuma distribuidora tinha interesse financeiro em investir neles.
Não dizemos que a pirataria é o único caminho. O que propomos é uma plataforma legal onde se possa pagar para ver esses filmes, parte do património cultural da humanidade. Enquanto não houver algo assim (e não falo de ter uma centena de filmes antigos de Hollywood, mas milhares de todos os géneros, épocas e países) é preciso recorrer a site que são enquadrados como piratas.
Também nos anos 60 havia rádios pirata porque as autorizadas só passavam músicas aprovadas e as pessoas queriam mais do que isso. Passando a haver rádios para todos os gostos o fenómeno esmoreceu. Hoje em dia nem o canal de televisão público tem interesse em passar regularmente cinema fora do convencional.
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