Born to be Wild
Mais do que apenas um filme de ficção, "Easy Rider" é como que uma ilustração sociológica dos Estados Unidos da América, no final dos anos 60.
Em 1969, Dennis Hopper realizava a sua primeira longa-metragem. O argumento tinha sido escrito em conjunto com Peter Fonda (que também foi produtor do filme) e Terry Southern (que se estreou na escrita de argumentos, em 1954, mais precisamente em "Dr. Estranho Amor", de Stanley Kubrick). A história girava em torno de dois amigos que resolviam pegar nas suas motos e fazer uma viagem pela América profunda; o primeiro título que teve foi "The Loners", cuja tradução seria algo como "Os Solitários", ou "Os Lobos Solitários". Acabou por se chamar "Easy Rider", nome que, por muitos, ainda hoje é tido como uma referência, não apenas do cinema, mas, sobretudo, num contexto em que surge associado a motoqueiros errantes, que procuram a liberdade em cada palmo da estrada/terra que percorrem. Na verdade, "Easy Rider", o filme, é muito mais do que a história de dois seres humanos e das suas 'Harley Davidsons'. É, igualmente, muito mais do que uma simples viagem. É uma busca, uma demanda, um ímpeto de procura de uma liberdade despojada, que foi beber muito do espírito à literatura 'beatnik' de Jack Kerouac, por exemplo, também ele e os seus livros, símbolos, ícones, do homem livre em permanente contestação consigo próprio e com a sociedade asfixiante que o rodeia. Assim, "Easy Rider", é, muito mais, uma película sobre a busca interior de dois homens e de todos quantos se lhes cruzam no caminho, todos eles párias em busca do seu rumo; muitos foram marginalizados pela sociedade, outros sofrem, quase, de misantropia; auto-marginalizaram-se e aproveitam para lucubrar, enquanto esperam conseguir abrir uma porta à redenção com o mundo e com eles próprios. Os EUA atravessavam um período conturbado, mas riquíssimo, na sua história, enquanto país, sobretudo nos aspectos culturais e artísticos, mas também nos político-sociais. A música (dos Velvet Underground aos Doors, da Janis Joplin, ao Bob Dylan), a poesia (de Bob Kaufman, a Allen Ginsberg), a literatura (de Jack Kerouac, a William Burroughs) e, de um modo geral, todas as artes, são exemplos disso mesmo. Se, a isto, juntarmos a contestação à guerra do Vietname, o consumo desenfreado de drogas, a libertação sexual, as palavras e os discursos mais ou menos inflamados - de Martin Luther King (menos) ou Malcolm X (mais) - sobre segregação racial, bem como a morte de ambos, verificamos que estamos a falar de um país em ebulição.
É verdade que "Easy Rider" não se centra em muitas destas questões, mas não é menos verdade que é fruto de todas elas. Os dois 'cavaleiros da estrada', Captain America (Peter Fonda) e Billy (Dennis Hopper) começam por arranjar dinheiro, fruto de uma transacção de drogas, logo no início da narrativa. Pegam nas notas e colocam-nas dentro de uma mangueira, no interior do depósito de gasolina das suas 'Harleys". O intuito é utilizar o montante que ganharam numa odisseia que os levará a percorrer o interior dos Estados Unidos da América. E, logo desde o seu início, onde se denota uma incontida ansiedade catártica, somos conduzidos, como que numa visita guiada, por algumas das comunidades 'hippies' isoladas das grandes cidades, até tudo descambar num final esvaído de esperança, causado pela brutalidade umbilicalmente ligada a uma arrogante, analfabeta e mesquinha sociedade americana simbolizada pelos homens da carrinha de caixa aberta com que se cruzam no final da jornada.
A presença de Jack Nicholson, aqui quase no princípio da sua carreira, e ainda relativamente longe dos êxitos e da dimensão que viria a alcançar nos anos vindouros, é portentosa. Elucidativo, quanto a esta questão, é o facto de ter sido nomeado, pela Academia, para o Óscar de Melhor Actor Secundário e, embora a vitória não lhe tenha sorrido, a simples nomeação contribuiu para a sua afirmação como um dos melhores actores dos últimos anos e, até mesmo, de sempre; estatuto, aliás, que hoje detém com inteira justiça. Não foi laureado pela Academia, nem ganhou o Globo de Ouro desse ano (para o qual também foi designado), mas venceu, todavia, os prémios para a melhor interpretação num papel secundário, atribuídos por duas das mais importantes associações de críticos norte-americanas nomeadamente - a NSFC e a NYFCC. Nos Óscares correspondentes ao ano de 1969, a indigitação de Nicholson não foi a única do filme, já que, igualmente nomeados para a estatueta dourada, foram os três argumentistas já referidos no princípio deste texto, que também não lograram vencer. Dennis Hopper acabaria, ainda, por receber, em Cannes, o galardão para o melhor primeiro trabalho. Trabalho, esse, que acabou por se tornar um enorme sucesso de bilheteira, tendo custado 340 000 dólares e facturado mais de 19 milhões.
O poder que "Easy Rider" exerceu em mim, quando o vi pela primeira vez, foi de tal modo colossal, que estaria tentado, mesmo hoje, a não parar de escrever sobre ele. Como o espaço não é assim tanto, o mais que posso fazer é dizer-vos, sem reticências, para o irem ver. Aluguem-no, no vosso clube de vídeo, ou comprem-no onde conseguirem! Não o vi à venda em nenhuma das lojas portuguesas, mas algumas aceitam encomendas e ainda existem videoclubes que o têm… Como alternativa podem sempre adquiri-lo pela internet, através do sítio http://www.amazon.com, por exemplo.
Mais do que apenas um filme de ficção, "Easy Rider" é como que uma ilustração sociológica dos Estados Unidos da América, no final dos anos 60.
Em 1969, Dennis Hopper realizava a sua primeira longa-metragem. O argumento tinha sido escrito em conjunto com Peter Fonda (que também foi produtor do filme) e Terry Southern (que se estreou na escrita de argumentos, em 1954, mais precisamente em "Dr. Estranho Amor", de Stanley Kubrick). A história girava em torno de dois amigos que resolviam pegar nas suas motos e fazer uma viagem pela América profunda; o primeiro título que teve foi "The Loners", cuja tradução seria algo como "Os Solitários", ou "Os Lobos Solitários". Acabou por se chamar "Easy Rider", nome que, por muitos, ainda hoje é tido como uma referência, não apenas do cinema, mas, sobretudo, num contexto em que surge associado a motoqueiros errantes, que procuram a liberdade em cada palmo da estrada/terra que percorrem. Na verdade, "Easy Rider", o filme, é muito mais do que a história de dois seres humanos e das suas 'Harley Davidsons'. É, igualmente, muito mais do que uma simples viagem. É uma busca, uma demanda, um ímpeto de procura de uma liberdade despojada, que foi beber muito do espírito à literatura 'beatnik' de Jack Kerouac, por exemplo, também ele e os seus livros, símbolos, ícones, do homem livre em permanente contestação consigo próprio e com a sociedade asfixiante que o rodeia. Assim, "Easy Rider", é, muito mais, uma película sobre a busca interior de dois homens e de todos quantos se lhes cruzam no caminho, todos eles párias em busca do seu rumo; muitos foram marginalizados pela sociedade, outros sofrem, quase, de misantropia; auto-marginalizaram-se e aproveitam para lucubrar, enquanto esperam conseguir abrir uma porta à redenção com o mundo e com eles próprios. Os EUA atravessavam um período conturbado, mas riquíssimo, na sua história, enquanto país, sobretudo nos aspectos culturais e artísticos, mas também nos político-sociais. A música (dos Velvet Underground aos Doors, da Janis Joplin, ao Bob Dylan), a poesia (de Bob Kaufman, a Allen Ginsberg), a literatura (de Jack Kerouac, a William Burroughs) e, de um modo geral, todas as artes, são exemplos disso mesmo. Se, a isto, juntarmos a contestação à guerra do Vietname, o consumo desenfreado de drogas, a libertação sexual, as palavras e os discursos mais ou menos inflamados - de Martin Luther King (menos) ou Malcolm X (mais) - sobre segregação racial, bem como a morte de ambos, verificamos que estamos a falar de um país em ebulição.
É verdade que "Easy Rider" não se centra em muitas destas questões, mas não é menos verdade que é fruto de todas elas. Os dois 'cavaleiros da estrada', Captain America (Peter Fonda) e Billy (Dennis Hopper) começam por arranjar dinheiro, fruto de uma transacção de drogas, logo no início da narrativa. Pegam nas notas e colocam-nas dentro de uma mangueira, no interior do depósito de gasolina das suas 'Harleys". O intuito é utilizar o montante que ganharam numa odisseia que os levará a percorrer o interior dos Estados Unidos da América. E, logo desde o seu início, onde se denota uma incontida ansiedade catártica, somos conduzidos, como que numa visita guiada, por algumas das comunidades 'hippies' isoladas das grandes cidades, até tudo descambar num final esvaído de esperança, causado pela brutalidade umbilicalmente ligada a uma arrogante, analfabeta e mesquinha sociedade americana simbolizada pelos homens da carrinha de caixa aberta com que se cruzam no final da jornada.
A presença de Jack Nicholson, aqui quase no princípio da sua carreira, e ainda relativamente longe dos êxitos e da dimensão que viria a alcançar nos anos vindouros, é portentosa. Elucidativo, quanto a esta questão, é o facto de ter sido nomeado, pela Academia, para o Óscar de Melhor Actor Secundário e, embora a vitória não lhe tenha sorrido, a simples nomeação contribuiu para a sua afirmação como um dos melhores actores dos últimos anos e, até mesmo, de sempre; estatuto, aliás, que hoje detém com inteira justiça. Não foi laureado pela Academia, nem ganhou o Globo de Ouro desse ano (para o qual também foi designado), mas venceu, todavia, os prémios para a melhor interpretação num papel secundário, atribuídos por duas das mais importantes associações de críticos norte-americanas nomeadamente - a NSFC e a NYFCC. Nos Óscares correspondentes ao ano de 1969, a indigitação de Nicholson não foi a única do filme, já que, igualmente nomeados para a estatueta dourada, foram os três argumentistas já referidos no princípio deste texto, que também não lograram vencer. Dennis Hopper acabaria, ainda, por receber, em Cannes, o galardão para o melhor primeiro trabalho. Trabalho, esse, que acabou por se tornar um enorme sucesso de bilheteira, tendo custado 340 000 dólares e facturado mais de 19 milhões.
O poder que "Easy Rider" exerceu em mim, quando o vi pela primeira vez, foi de tal modo colossal, que estaria tentado, mesmo hoje, a não parar de escrever sobre ele. Como o espaço não é assim tanto, o mais que posso fazer é dizer-vos, sem reticências, para o irem ver. Aluguem-no, no vosso clube de vídeo, ou comprem-no onde conseguirem! Não o vi à venda em nenhuma das lojas portuguesas, mas algumas aceitam encomendas e ainda existem videoclubes que o têm… Como alternativa podem sempre adquiri-lo pela internet, através do sítio http://www.amazon.com, por exemplo.
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