Dunkirk. O mundo anseia pelo épico de Nolan sobre um dos momentos mais marcantes da Segunda Guerra Mundial. Mas enquanto isso, uma pequena produção galesa mostra o outro lado do evento.
Gemma Arterton é a estrela maior do filme. A actriz que tem andado um pouco retirada dos filmes que chegam cá e cujas actuações ironicamente têm sido constantes fracassos de bilheteira, era por si só motivo suficiente para se ver o filme, mas aqui tem uma das interpretações que lhe podem valer muito mais do que isso. Sabem, é que é um filme sobre a arte de fazer filmes e isso costuma valer prémios. Mesmo eu que normalmente embirro com esse género de filme manipulador me rendi a esta história. Fica já aqui um alerta: não é uma comédia como tem sido promovido. Há momentos leves e até permite umas boas gargalhadas, mas é também um drama forte, tal como o filme dentro do filme. Pessoas com um coração poderão verter lágrimas e fungar por isso muito cuidado.
A dinamarquesa Lone Scherfig, que nos dá pérolas do cinema inglês como
"An Education", volta a pegar num assunto britânico para nos narrar as aventuras de uma jovem galesa durante os bombardeamentos alemães. Estamos numa época fulcral para o desenvolvimento da sociedade actual. Com o recrutamento de todos os homens jovens e capazes, os novos, os velhos, os coxos e as mulheres de todas as idades, tiveram de arregaçar as mangas e pegar nos trabalhos que ficaram vagos para manter o país, a economia e o exército a funcionar. Arterton interpreta Catrin Cole, que foi assim promovida de secretária a escritora no jornal e depois saltou para a equipa do Ministério da Informação. Como era mulher foi enviada entrevistar duas gémeas que teriam contribuído para o resgate dos soldados. Como era criativa, tornou isso numa ideia de filme. Como estava lá, foi convidada a juntar-se à equipa de argumentistas do filme. E depois, trabalhou tanto como qualquer homem para provar que era tão boa ou melhor do que eles e conquistar um lugar que era seu por direito. Não sabe que está a lutar pelas mulheres de todo o mundo, sabe que está a lutar para salvar o que resta da moral britânica numa guerra que estão a perder em todas as frentes.
Para perceber completamente "
Their Finest" é fundamental saber tudo sobre esta guerra, desde o mito das cenouras, até às datas de cada batalha. Contudo, o primeiro passo é saber o que foi Dunkirk, a mais negra das noites e a mais clara das alvoradas. Quando a França fez o seu plano de defesa contra a invasão nazi, tinha a certeza que não poderiam atravessar a floresta das Ardenas e portanto foi defender as planícies. Estava enganada, e tal como os aliados venceram devido às Ardenas (Bulge em 1944), em 1940 os aliados foram destruídos nas Ardenas. A infantaria ficou numa situação muito complicada e 400000 homens estavam cercados por um exército com o dobro do tamanho. O vice-almirante Ramsay tinha de salvar esses homens - britânicos, franceses e belgas – ou não teriam condições humanas ou anímicas de continuar. Perdeu 9 dos 10 contra-torpedeiros que enviou, mas salvou os seus homens porque centenas de civis atravessaram o canal da Mancha nos seus pequenos barcos para chegar onde os navios de guerra não chegavam. Podiam não ser os seus vizinhos, amigos, colegas, pais, filhos ou irmãos, podiam até não ser da sua nacionalidade, mas eram os seus soldados pois estavam a lutar pela sua liberdade, e era chegada a hora de retribuírem. A missão de Catrin Cole e dos seus colegas na indústria do cinema é fazerem um filme que diga ao país que cada um pode ser um herói. Que cada acção pode salvar uma vida. Que unidos vencerão.
Cole chega com uma atitude diferente. Acostumada a trabalhar sem ser incomodada por homens, não se deixa menosprezar e com o seu trabalho de qualidade e a sua subtileza, vai carregando o filme contra tudo e contra todos até chegar a bom porto. O seu trabalho estará completo quando o filme tiver cumprido a sua missão. E quão fabuloso é o seu trabalho. Num set de rodagem os problemas pessoais complicam o que já não era um trabalho simples. Os bombardeamentos não ajudam e a qualquer momento podem perder um colega e ter de improvisar sem ele. Ou perder a casa e a família durante a noite e de manhã dizer
the show must go on e voltar ao estúdio.
Todos os meses saem novos filmes sobre os heróis de guerra que empunhavam armas. Finalmente alguém diz “basta!” e mostra que o orgulho de uma nação são todos os homens e mulheres que dão aquilo em que são melhores para que juntos possam vencer. Afinal, se gostam de citar erradamente Churchill dizendo "
a Cultura é aquilo pelo que estamos a lutar", porque não se deram ao trabalho de mostrar como se lutava na cultura? Não vende bilhetes?
Um filme incrível que sem ser ambicioso surpreende de todas as formas. Tanto na comédia como no drama.