"Waltz With Bashir" por Ricardo Clara
Coincidências à parte, estrear um filme que procura redimir consciências sobre o papel da Força de Defesa Israelita (IDF) nos massacres de palestinianos, perpretados nos campos de refugiados de Sabra e Chatil, numa altura em que Israel bombardeia sem apelo nem agravo a Faixa de Gaza, confirma mais uma vez o cinema como um veículo entre a história e a actualidade.
Num registo docu-ficcional, "Waltz With Bashir" / "A Valsa com Bashir" é a oportunidade terapeutica de Ari Folman procurar entender qual foi o seu papel naqueles massacres, tendo como ponto de partida uma conversa num bar com um antigo companheiro de armas. Por entre dois copos, o seu velho amigo conta-lhe como está intrigado por um sonho recorrente que tem, onde é perseguido por 26 cães raivosos, cuja intenção é tirarem-lhe a vida. A curiosidade deste número tão certo - 26 - transporta-os de volta para a guerra Líbano-Israel, onde ambos combateram, e onde aquele soldado teve de liquidar essa quantidade de cães, para estes não avisarem a população da chegada das tropas.
É neste ponto, que Folman se questiona: qual foi o seu verdadeiro papel na guerra? A que distância esteve dos massacres? Isto, porque é incapaz de ter memórias concretas desse pedaço da sua vida. Folman não está amnésico. Ele simplesmente encontrou um mecanismo de defesa que lhe impede de recordar aquele capítulo da guerra.
Assim, decide encetar uma visita por vários colegas de armas, para tentar entender, no meio das suas visões alucinadas de vermelhos, castanhos e amarelos tão carregados que até chegam a doer, onde se cruzam flashes luminosos nos céus de Beirute com uma mulher nua gigante onde ele navega, o verdadeiro papel da IDF na contenda.
Para tal, Folman recorre à rotoscopia digital enquanto técnica de animação para exacerbar as suas dúvidas e alucinações, num processo de catarse não só interior, mas também agregada ao colectivo israelita e à consciência de um povo que ainda hoje procura saber (se é que já não sabe, mas só agora torna público) o alcance do conflito israelo-libanês. Através dela, onde a imagem real é manipulada digitalmente, distorce as cores e profundidades, carrega as imagens com uma luminosidade quase transcendental, hiperbolizando a narrativa. Pouco a pouco, com entrevistas a várias pessoas que fizeram parte da guerra, aproxima-se da questão de Sabra e Chatil, e tenta erguer, tijolo por tijolo, um edifício de recordações perdidas.
Quando lá chega, Folman percebe que a realidade é dura de mais para ser transmitida pela animação, e decide mostrar o horror final na sua versão mais cruel e directa.
Uma obra pura e sincera, despudorada, eléctrica e flamejante, um verdadeiro "Apocalypse Now" israelita, que demonstra pela via do excesso visual, a ténue linha entre a verdade na guerra e a sua ficção. Indispensável.
Num registo docu-ficcional, "Waltz With Bashir" / "A Valsa com Bashir" é a oportunidade terapeutica de Ari Folman procurar entender qual foi o seu papel naqueles massacres, tendo como ponto de partida uma conversa num bar com um antigo companheiro de armas. Por entre dois copos, o seu velho amigo conta-lhe como está intrigado por um sonho recorrente que tem, onde é perseguido por 26 cães raivosos, cuja intenção é tirarem-lhe a vida. A curiosidade deste número tão certo - 26 - transporta-os de volta para a guerra Líbano-Israel, onde ambos combateram, e onde aquele soldado teve de liquidar essa quantidade de cães, para estes não avisarem a população da chegada das tropas.
É neste ponto, que Folman se questiona: qual foi o seu verdadeiro papel na guerra? A que distância esteve dos massacres? Isto, porque é incapaz de ter memórias concretas desse pedaço da sua vida. Folman não está amnésico. Ele simplesmente encontrou um mecanismo de defesa que lhe impede de recordar aquele capítulo da guerra.
Assim, decide encetar uma visita por vários colegas de armas, para tentar entender, no meio das suas visões alucinadas de vermelhos, castanhos e amarelos tão carregados que até chegam a doer, onde se cruzam flashes luminosos nos céus de Beirute com uma mulher nua gigante onde ele navega, o verdadeiro papel da IDF na contenda.
Para tal, Folman recorre à rotoscopia digital enquanto técnica de animação para exacerbar as suas dúvidas e alucinações, num processo de catarse não só interior, mas também agregada ao colectivo israelita e à consciência de um povo que ainda hoje procura saber (se é que já não sabe, mas só agora torna público) o alcance do conflito israelo-libanês. Através dela, onde a imagem real é manipulada digitalmente, distorce as cores e profundidades, carrega as imagens com uma luminosidade quase transcendental, hiperbolizando a narrativa. Pouco a pouco, com entrevistas a várias pessoas que fizeram parte da guerra, aproxima-se da questão de Sabra e Chatil, e tenta erguer, tijolo por tijolo, um edifício de recordações perdidas.
Quando lá chega, Folman percebe que a realidade é dura de mais para ser transmitida pela animação, e decide mostrar o horror final na sua versão mais cruel e directa.
Uma obra pura e sincera, despudorada, eléctrica e flamejante, um verdadeiro "Apocalypse Now" israelita, que demonstra pela via do excesso visual, a ténue linha entre a verdade na guerra e a sua ficção. Indispensável.
Título Original: "Waltz With Bashir" (Israel/Alemanha/França /EUA, 2008) Realização: Ari Folman Argumento: Ari Folman Intérpretes: Ari Folman, Ron Ben-Yishai e Ronny Dayag Animação: David Polonsky Música: Max Richter Género: Guerra / Animação / Documentário Duração: 90 min. Sítio Oficial: http://waltzwithbashir.com |