Realizar um filme que viesse a suceder a "No Country For Old Men" (2007) era uma tarefa hercúlea para Joel e Ethan Coen, os grandes vencedores da noite de Óscares de 2008, com a impressionante história do assassino Anton Chigurh. "Burn After Reading" / "Destruir Depois de Ler" foi o passo seguinte da dupla de realizadores.
Difícil, porque a fórmula dos Coen assenta sempre em premissas bem definidas: personagens bem estruturadas, ambiente desenhado ao pormenor, e um argumento equilibrado e escrito com enorme precisão. "No Country..." atingiu um equilíbrio absolutamente notável, como já havia acontecido com "Blood Simple." (1984), "Miller's Crossing" (1990), "Fargo" (1996) e "The Big Lebowski" (1998, onde produzem a comédia de eleição da sua filmografia). Acontece que, em muitos casos, a linearidade não é atingida, acabando a peça final por redundar num fita competente, mas longe de ser extraordinária.
Em "Burn After Reading" / "Destruir Depois de Ler", Chad Feldheimer (Brad Pitt) e Linda Litzke (Frances McDormand) são dois intrutores num ginásio de Washington. Chad é um tipo oco, viciado em pastilha elástica e exercício físico, e tem em Linda a sua melhor amiga. Esta, por sua vez, traçou como meta a sua refundação pessoal, que passa por ser submetida a algumas intervenções estéticas, para encontrar definitivamente o amor.
Nesse ginásio encontram um CD com um sem número de informações valiosas da CIA, que por descuido foi deixado no chão do balneário feminino. Esse material pertence a Osbourne Cox (John Malkovich), um operacional governamental a contas com um despedimento por alcoolismo. Cox é casado com Katie (Tilda Swinton), a qual tem uma relação amorosa com Harry Pfarrer (George Clooney), um marshal norte-americano. Este, por sua vez, não só é casado com uma autora de sucesso de livros infantis (Elizabeth Marvel), como decide (por intermédios de sites online de encontros) envolver-se com Linda (como muito bem podia envolver-se com qualquer mulher que lhe respondesse).
O que aparenta ser uma enorme confusão, torna-se numa linear estória de espiões, com Linda e Chad a tentarem vender a informação à embaixada russa nos EUA, e um grupo de espiões e pseudo-espiões a perseguirem-se uns aos outros sem sair do síto.
As personagens, como é apanágio dos Coen, são esculpidas com uma minúcia irrepreensível, apoiado na obrigatória maestria dos actores que a encarnam, e resultam maravilhosamente. O Chad de Pitt confirma este como um actor um nível acima dos demais, desencantando um boneco tonto como nunca haviamos visto. Linda é interpretada por Frances McDormand e, à partida, seriam desnecesessárias mais adjectivações à construção deste trabalho. Palerma mas onírica, decidida mas descrente de si mesma, apura uma enorme interpretação, a fazer lembrar Marge Gunderson de "Fargo".
Clooney é competente, como sempre. Um bipolar de eleição, que de um momento para o outro se transforma num agente da autoridade depravado e confiante (prova disso a almofada triangular de espuma ou a cadeira que constroi, top-secret, na arrecadação) numa bailarina amedrontada, a correr parque fora. Malkovich regressa, finalmente, a um grande papel. É o estupor perfeito, alcoólico de fim de tarde, rei e senhor do vocábulo fuck e de todas as suas declinações.
A realização, como sempre, imaculada, apoiada na fotografia de Emmanuel Lubezki ("Children of Men", 2006) e na banda sonora ritmada e muito bem definida de Carter Burwell (que já havia trabalhado com os Coen em "O Brother, Where Art Thou?" - 2000, entre outros). De antologia, sequências como a do disparo sobre Chad (e a expressividade deste na desconfiança do uso a dar à dita almofada, que culmina com Pfarrer esticado no chão, atónito) ou a de Malkovich de roupão e machado a invadir a sua própria casa.
Infelizmente, desequilibra-se um pouco quando o burlesco é levado ao extremo, mas nem por isso deixa de ser uma comédia de enorme sagacidade e ao nível do melhor que em 2008 se fez no cinema de comédia norte-americano. Simplesmente, made-in Coen.
Difícil, porque a fórmula dos Coen assenta sempre em premissas bem definidas: personagens bem estruturadas, ambiente desenhado ao pormenor, e um argumento equilibrado e escrito com enorme precisão. "No Country..." atingiu um equilíbrio absolutamente notável, como já havia acontecido com "Blood Simple." (1984), "Miller's Crossing" (1990), "Fargo" (1996) e "The Big Lebowski" (1998, onde produzem a comédia de eleição da sua filmografia). Acontece que, em muitos casos, a linearidade não é atingida, acabando a peça final por redundar num fita competente, mas longe de ser extraordinária.
Em "Burn After Reading" / "Destruir Depois de Ler", Chad Feldheimer (Brad Pitt) e Linda Litzke (Frances McDormand) são dois intrutores num ginásio de Washington. Chad é um tipo oco, viciado em pastilha elástica e exercício físico, e tem em Linda a sua melhor amiga. Esta, por sua vez, traçou como meta a sua refundação pessoal, que passa por ser submetida a algumas intervenções estéticas, para encontrar definitivamente o amor.
Nesse ginásio encontram um CD com um sem número de informações valiosas da CIA, que por descuido foi deixado no chão do balneário feminino. Esse material pertence a Osbourne Cox (John Malkovich), um operacional governamental a contas com um despedimento por alcoolismo. Cox é casado com Katie (Tilda Swinton), a qual tem uma relação amorosa com Harry Pfarrer (George Clooney), um marshal norte-americano. Este, por sua vez, não só é casado com uma autora de sucesso de livros infantis (Elizabeth Marvel), como decide (por intermédios de sites online de encontros) envolver-se com Linda (como muito bem podia envolver-se com qualquer mulher que lhe respondesse).
O que aparenta ser uma enorme confusão, torna-se numa linear estória de espiões, com Linda e Chad a tentarem vender a informação à embaixada russa nos EUA, e um grupo de espiões e pseudo-espiões a perseguirem-se uns aos outros sem sair do síto.
As personagens, como é apanágio dos Coen, são esculpidas com uma minúcia irrepreensível, apoiado na obrigatória maestria dos actores que a encarnam, e resultam maravilhosamente. O Chad de Pitt confirma este como um actor um nível acima dos demais, desencantando um boneco tonto como nunca haviamos visto. Linda é interpretada por Frances McDormand e, à partida, seriam desnecesessárias mais adjectivações à construção deste trabalho. Palerma mas onírica, decidida mas descrente de si mesma, apura uma enorme interpretação, a fazer lembrar Marge Gunderson de "Fargo".
Clooney é competente, como sempre. Um bipolar de eleição, que de um momento para o outro se transforma num agente da autoridade depravado e confiante (prova disso a almofada triangular de espuma ou a cadeira que constroi, top-secret, na arrecadação) numa bailarina amedrontada, a correr parque fora. Malkovich regressa, finalmente, a um grande papel. É o estupor perfeito, alcoólico de fim de tarde, rei e senhor do vocábulo fuck e de todas as suas declinações.
A realização, como sempre, imaculada, apoiada na fotografia de Emmanuel Lubezki ("Children of Men", 2006) e na banda sonora ritmada e muito bem definida de Carter Burwell (que já havia trabalhado com os Coen em "O Brother, Where Art Thou?" - 2000, entre outros). De antologia, sequências como a do disparo sobre Chad (e a expressividade deste na desconfiança do uso a dar à dita almofada, que culmina com Pfarrer esticado no chão, atónito) ou a de Malkovich de roupão e machado a invadir a sua própria casa.
Infelizmente, desequilibra-se um pouco quando o burlesco é levado ao extremo, mas nem por isso deixa de ser uma comédia de enorme sagacidade e ao nível do melhor que em 2008 se fez no cinema de comédia norte-americano. Simplesmente, made-in Coen.
Título Original: "Burn After Reading" (EUA, 2008) Realização: Joel e Ethan Coen Argumento: Joel e Ethan Coen Intérpretes: Frances McDormand, John Malkovich, Tilda Swinton, George Clooney e Brad Pitt Fotografia: Emmanuel Lubezki Música: Carter Burwell Género: Drama / Comédia Duração: 96 min. Sítio Oficial: http://http://www.filminfocus.com/focusfeatures/film/burn_after_reading |
2 comentários:
Eu gostei do filme, principalmente pelo trabalho dos vários actores - nomeadamente de Brad Pitt, já tantas vezes referido por aí. Mas tenho de admitir que saí da sala com falta de alguma coisa. Este vou esquecer facilmente, concerteza...
Concordo, Izzie... Agora é esperar o próximo dos Coen.
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