Uma das características que sempre admirei no cinema italiano foi a capacidade que este sempre teve em ver a sua sociedade de uma maneira muito mais crítica e pessoal do que as próprias pessoas que a integram. No fundo, sempre existiu, de Elio Petri a Francesco Rosi, um modo especial de personificar uma certa societas em histórias avulsas, sempre que surjam razões para duvidar do equilíbrio do colectivo e a ascenção do individual sobre aquele, fazendo perigar os mais simples cânones de socialização.
"Gomorra", de Matteo Garrone, numa adaptação do livro homónimo de Roberto Saviano (o qual, fruto desta obra, se encontra semi-exilado em Itália, com protecção policial diária) aborda de forma tenaz e pungente o mundo da máfia napolitana, a Camorra, em concreto a região situada na periferia de Nápoles, onde residem milhares de famílias em subcondições, completamente votadas ao abandono e à discricionaridade de controlo dos camorristi italianos.
Aqui, observamos cinco quadros independentes, unidos entre si pela organização mafiosa que gere a cidade. Num realização-mosaico, acompanhamos dois jovens que aspiram a ser o Tony Montana de "Scarface", roubando armas e droga, sem preocupações nem pudores; a iniciação de um jovem filho da dona de uma mercearia, com aspirações a fazer parte da hierarquia da Camorra. Ao lado destes, um recém formado que se une a um homem que colecciona dinheiro a encontrar locais para despejar ilegalmente o lixo produzido na cidade (numa muito actual visão sobre o problema dos aterros e do lixo napolitano, que ainda recentemente foram tema de notícia); trabalho diferente aquele protagonizado por Don Ciro, o qual assiste ao seu declínio na arte de distribuir dinheiro pelas famílias que são mensalmente compradas para ficarem de um lado da guerra da máfia; até ao estilista italiano que se vende aos chineses.
Vender. Comprar. Tudo assenta nestas duas premissas, onde o dinheiro é rei e a Campânia Estado.
Filmado com a precisão de um relojoeiro, "Gomorra" é um dos filmes mais importantes do género da história do cinema. Assim, sem qualquer limitação. Estilisticamente brutal, despojado de complexos, nu e cru, não recorre a nenhum tipo de adorno ou nobreza para embelezar o cenário. A história, o local, a tradição, são cinzentas e sujas. E para tal cenário Garrone não tem contemplações em, numa mistura de cuidado com peça em bruto, mostrar exactamente as coisas como são. Minimalista na banda sonora, a qual é unicamente composta pelas exactas sonoridades que os camorristi ouvem, tece com paciência planos extraordinários, numa comungão plena entre a arquitectura e a lente - como são a maioria das cenas que decorrem nos corredores e terraços dos Vele, complexos habitacionais triangulares que conferem uma impressionante força e que crescem como personagem ao longo do filme.
Tivesse Garrone a ousadia de unir com maior destreza os cinco mosaicos, e estariamos perante uma obra-prima. Assim, estamos perante um filme de génio, e uma das obras fundamentais do século.
"Gomorra", de Matteo Garrone, numa adaptação do livro homónimo de Roberto Saviano (o qual, fruto desta obra, se encontra semi-exilado em Itália, com protecção policial diária) aborda de forma tenaz e pungente o mundo da máfia napolitana, a Camorra, em concreto a região situada na periferia de Nápoles, onde residem milhares de famílias em subcondições, completamente votadas ao abandono e à discricionaridade de controlo dos camorristi italianos.
Aqui, observamos cinco quadros independentes, unidos entre si pela organização mafiosa que gere a cidade. Num realização-mosaico, acompanhamos dois jovens que aspiram a ser o Tony Montana de "Scarface", roubando armas e droga, sem preocupações nem pudores; a iniciação de um jovem filho da dona de uma mercearia, com aspirações a fazer parte da hierarquia da Camorra. Ao lado destes, um recém formado que se une a um homem que colecciona dinheiro a encontrar locais para despejar ilegalmente o lixo produzido na cidade (numa muito actual visão sobre o problema dos aterros e do lixo napolitano, que ainda recentemente foram tema de notícia); trabalho diferente aquele protagonizado por Don Ciro, o qual assiste ao seu declínio na arte de distribuir dinheiro pelas famílias que são mensalmente compradas para ficarem de um lado da guerra da máfia; até ao estilista italiano que se vende aos chineses.
Vender. Comprar. Tudo assenta nestas duas premissas, onde o dinheiro é rei e a Campânia Estado.
Filmado com a precisão de um relojoeiro, "Gomorra" é um dos filmes mais importantes do género da história do cinema. Assim, sem qualquer limitação. Estilisticamente brutal, despojado de complexos, nu e cru, não recorre a nenhum tipo de adorno ou nobreza para embelezar o cenário. A história, o local, a tradição, são cinzentas e sujas. E para tal cenário Garrone não tem contemplações em, numa mistura de cuidado com peça em bruto, mostrar exactamente as coisas como são. Minimalista na banda sonora, a qual é unicamente composta pelas exactas sonoridades que os camorristi ouvem, tece com paciência planos extraordinários, numa comungão plena entre a arquitectura e a lente - como são a maioria das cenas que decorrem nos corredores e terraços dos Vele, complexos habitacionais triangulares que conferem uma impressionante força e que crescem como personagem ao longo do filme.
Tivesse Garrone a ousadia de unir com maior destreza os cinco mosaicos, e estariamos perante uma obra-prima. Assim, estamos perante um filme de génio, e uma das obras fundamentais do século.
Título Original: "Gomorra" (Itália, 2008) Realização: Matteo Garrone Argumento: Roberto Saviano (romance) e Grégory Levasseur (argumento) Intérpretes: Salvatore Abruzzese, Simone Sacchettino e Gianfelice Imparato Fotografia: Marco Onorato Música: n/d Género: Crime / Drama Duração: 137 min. Sítio Oficial: http://www.mymovies.it/gomorra |
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