23 de maio de 2018

"The Death of Stalin" por Nuno Reis


A Segunda Guerra Mundial foi uma confusão. Entre alianças e traições, jogos de bastidores e mentiras, a velha definição de bons e maus deixou de se aplicar. Quando a “guerra para acabar com todas as guerras” terminou, muitos dos mais malvados ditadores continuavam em cargos de liderança, outros tinham subido ao poder com essa ajuda, e a ameaça vermelha ocupou metade da Europa. O mundo entrou numa Guerra Fria entre países e blocos, mas isso não impediu os indivíduos de continuarem com os seus esquemas com vista ao lucro pessoal. O caso mais importante foi o processo para suceder a Estaline. Quem tomaria as rédeas do regime que exterminava qualquer oposição? Continuaria com as mortes e os exílios para os gulags na Sibéria? Quando o líder soviético sucumbiu, vários se perfilaram para ficar com o lugar de topo no maior império contínuo do mundo. Beria, Malenkov, Khrushchev, Molotov, Zhukov? Quem ficaria com o lugar? Quem pereceria tentando? Quem seria destruído no processo?
Um livro francês, um realizador escocês, um elenco maioritariamente britânico com americanos e ucranianos à mistura, podia ser uma forte crítica ao regime e uma oportunidade dourada para massacrar a Rússia actual que está numa guerra de palavras com os ingleses. Todavia o que nos é apresentado é uma comédia que dispensa as aulas de História. Basta saber que a Rússia era uma ditadura violenta disfarçada de utopia comunista e que tinham um sistema isolacionista que só um território tão extenso podia sonhar fazer. Depois os acontecimentos sucedem-se. O tráfico de influências dispara. Começam os jogos de cadeiras e quem ficar sem cadeira (ou com a cadeira errada) pagará com a vida. Saber os factos reais até prejudica o espectador pois esta história, de tão incrível que é, parece uma realidade alternativa. Já sabemos quem vai ganhar, mas nada do que vemos indica isso. É tudo uma surpresa completamente louca que parece satirizar o processo hilariamente unânime que Stalin desejava para o seu partido.
Um elenco extremamente competente liderado por Steve Buscemi, com o refúgio cómico em Jeffrey Tambor e uma série de ilustres como Michael Palin, Simon Russell Beale, Paddy Considine, Andrea Riseborough, Rupert Friend, Jason Isaacs e Olga Kurylenko transporta-nos para esta Rússia tão sólida por fora como trémula no seu âmago. É um filme fácil de ver que expõe como poucos a Rússia dos anos 50. Critica pessoas, mentalidades e o regime. Brinca com acontecimentos reais e lembra-nos do que acontece a quem procura o poder absoluto. Terá o seu público de eleição entre os apreciadores da época e os fãs daqueles poucos actores que se excederam para dar vida a figuras imponentes da história recente russa, mas é feito para todos. Podia ter sido mais ambicioso, mas, para a nossa época, já foi uma surpresa ter tido a ousadia típica da propaganda dos anos 60 de mostrar a Rússia como um monstro.
The Death of StalinTítulo Original: "The Death of Stalin" (França, Reino Unido, Bélgica, Canadá, 2017)
Realização: Armando Iannucci
Argumento: Armando Iannucci, David Schneider, Ian Martin, Peter Fellows, Fabien Nury (baseados na obra de Fabien Nury e Thierry Robin)
Intérpretes: Simon Russell Beale, Steve Buscemi, Paddy Considine, Adrian McLoughlin, Michael Palin, Simon Russell Beale, Jeffrey Tambor, Olga Kurylenko, Andrea Riseborough, Jason Isaacs, Rupert Friend
Música: Christopher Willis
Fotografia: Zac Nicholson
Género: Comédia, História
Duração: 107 min.
Sítio Oficial: http://www.deathofstalin-film.de