17 de maio de 2007

"Zodiac" por Ricardo Clara

Fincher voltou a conseguir. Depois de "Seven" e "Fight Club", o genial realizador norte-americano surpreende com um delicioso policial, completamente distante do estilo usado naqueles dois filmes, mas que nos transporta para uma América dos anos 60-70, impecavelmente reconstituída, onde, no encalço do célebre assassino que atormentou a San Francisco daquela época, manipula da nossa atenção ao nosso ritmo cardíaco.
"Eu quero um bom filme sobre mim" escreveu Zodiac na última carta ao jornal Chronicle em 1978. Pois não recebe um bom filme - recebe um genial. Em 1969, três jornais abrem simultaneamente uma carta a assumir a paternidade de um homicídio de uma adolescente (onde o rapaz escapou desse mesmo destino). A partir daí, duas forças se dedicam à busca do assassino, recebendo amiude correspondência com pormenores dos crimes, despoletando uma obsessão pela procura. David Toschi (um genial Mark Rufallo, que interpreta aquele que foi a inspiração para o Dirty Harry de Eastwood) e William Armstrong (Anthony Edwards) são os dois "duros" da polícia que perseguem todas as pistas deixadas por Zodiac: Toschi, a viver para a investigação, desprovido de sentimentos, angustiado pelos parcos indícios que tem de solucionar o caso; e Armstrong, como uma espécie de Watson de Sherlock Holmes para Toschi. Do outro lado (o do Chronicle), o jornalista criminal Paul Avery (vénia para Robert Downey Jr., com uma interpretação a candidatar-se para um Óscar: possessivo, irónico e venenoso, encarna na perfeição a espiral de demência alcoolica e obsessiva resultante da investigação), cuja linha de invisibilidade do assassino se cruza com a do desespero deste; a par do cartonista Robert Graysmith (outra interpretação de luxo, agora de Jake Gyllenhaal, na pele do autor do livro que foi base desta obra).
E este é, efectivamente, um filme de linhas e de pormenores. De linhas, porque tudo se cruza: a investigação da polícia com a do jornal, a obsessão de Graysmith com a de Toschi, a timidez e sobriedade do primeiro com Armstrong (ambos uns Watsons dos respectivos Holmes) ou o declínio de loucura de Avery com Toschi. E se provas queriamos, nada como recordar uma cena de diálogo paralelo, entre a dupla da lei e a do jornalismo, onde, e em edifícios diferentes, uma pergunta de Toschi é respondida por Graysmith numa espécie de paralelismo temporal da mesma conversa. Pormenores, na investigação cuidadosamente preparada por Fincher, nos detalhes de época, ao juntar quatro condados diferentes, cada um com os seus indícios; e, pessoal e especialmente, as passagens temporais: definir um interregno de 4 anos com uma imagem de um arranha céus a ser construído em grande velocidade ou uma pausa de vários segundos com o ecrã negro é daquelas delícias que me levam a depositar uma fé única no trabalho deste genial realizador.
No fim, fica a dúvida: será que Arthur Leigh Allen (um genial e inquietante John Carrol Lynch) era mesmo o Zodiac? Mas, e numa película de duas horas e meia, estrondosamente montada, deliciosamente sonorizada isso não tem relevo, quando encontrar o assassino é o que menos importa neste brilhante "Zodiac". Obrigado, Fincher.






Título Original: "Zodiac" (EUA, 2007)
Realização: David Fincher
Argumento: James Vanderbilt e Robert Graysmith
Intérpretes: Robert Downey Jr., Mark Ruffalo, Jake Gyllenhaal, Anthony Edwards, Brian Cox e Chloë Sevigny
Fotografia: Harris Savides
Música: David Shire
Género: Thriller / Policial
Duração: 158 min.
Sítio Oficial: http://www.zodiacmovie.com

2 comentários:

Anónimo disse...

espero ir ver hoje... no entanto esse não é o poster do filme. è o do outro filme com outra versão da mesma história . esse filme estreou ha dois anos senão me engano

RC disse...

Obrigado pela chamada de atenção, Marco, já corrigido o erro. E também pela visita! Bom cinema