3 de março de 2014

"Pecado Fatal" por Nuno Reis


Tenho de começar pelas más notícias e alertar todos os que ouçam falar do filme para algo preocupante. O pior de “Pecado Fatal” é o título. É um título vindo de nenhures que em nada ajudará na promoção de um filme que de resto tem tudo para ser um sucesso. É verdade que aquela combinação de palavras deixa qualquer um de pé atrás, mas o cinema português também nos tem trazido algumas desilusões com nomes mais apelativos. Esta, pelo contrário, é uma produção portuguesa, para o público português. Nem demasiado intelectual, nem demasiado comercial, com algumas falhas distribuídas pelas equipas envolvidas, mas que passarão despercebidas por entre o todo que tem uma qualidade vários furos acima da média, não só a nível nacional como europeu. Portanto, se a partir de 24 de Abril o tiverem em exibição por perto, não percam a melhor oportunidade em muito tempo de se reconciliarem com o nosso cinema.

Esta história tem duas partes. Por um lado temos Liliana, uma jovem que parte numa longa viagem a fugir do seu passado recente e em busca de um futuro que, se não pode não ser risonho, seja pelo menos sorridente. Depois temos Nuno, um rapaz simpático cuja vida dá uma volta de cento e oitenta graus quando recebe a visita de Miguel, seu amigo de longa data que tarde e a más horas precisa de um cúmplice. Serão estas duas vidas em diferentes fusos horários que nos vão prender ao ecrã.

O que tem de tão especial o filme? Simplesmente arrasa com as expectativas. Apesar do título, como já conhecia o trabalho de Luís Diogo fui ver com a confiança que as produções Filmógrafo/Cineclube de Avanca fizeram por merecer ao longo dos anos. E o que aconteceu naquela sala de cinema foi mágico. A fotografia é apelativa desde o princípio. O argumento tem pés e cabeça e é completamente ajustado à nossa realidade, sem que se aproveite disso em demasia. Os actores sabem o que estão a fazer. Muito do que estava a parecer estranho faz sentido com o decorrer da história. Quando termina, as dúvidas voltam a surgir. "Isto que acabei de ver foi um filme português?", "Se é possível fazer coisas destas, porque não o fazemos mais vezes? Ou sempre? Podia ser que o público se voltasse a conectar com a nossa produção. A indústria certamente agradeceria!"
Se querem ouvir dizer mal, temos pena, mas estão a ler sobre o filme errado. É verdade que o realizador poderia ter optado por dar mais variedade aos planos escolhidos. É uma falha normal de quem vem das curtas. E algumas partes do argumento podem ter sido um pouco feridas na sala de edição. Mas são coisas mínimas que é preciso estar muito atento para notar e acontecem em imensos filmes onde passam despercebidas entre as outras falhas, enquanto que aqui essas minúsculas imperfeições sobressaem e incomodam porque prejudicam um belíssimo trabalho (e podiam ter sido evitadas).

Indo por partes, a fotografia ser boa não é surpresa. Portugal sempre teve bons profissionais nessa área. O argumento ser bom é algo mais raro. Contam-se pelos dedos aqueles capazes de construir uma longa do início ao fim, seja por limitação própria ou por imposição do produtor. Mas onde Portugal é uma miséria, é nos actores. Pegar em modelos e colocá-los em televisão é fácil, mas não corre bem. O pior é que essa praga se expandiu para o cinema, onde um nome popular rende mais do que alguém bom no que faz. Todavia, aqui não houve esse problema. Felizmente o dinheiro era pouco e por isso não foram em busca dos nomes famosos, puderam limitar-se a desencantar aquela espécie rara de actores, os que sabem o que fazem. E o que é quase inédito por estes lados, deram-lhes diálogos credíveis. Não desfazendo o trabalho impecável de Miguel Meira - como a infeliz vítima das circunstâncias - e o alívio cómico trazido por João Guimarães - como o representante do que de mais nojento o sexo masculino é capaz - a estrela do filme é Sara Barros Leitão. Podem já a ter visto em algumas outras produções, mas esta Liliana que construiu, é algo extraordinário. Alegrias, tristezas, caretas, explosões de humor, tudo o que faz tem tal expressividade que não se sente como uma personagem de ficção, mas como uma pessoa presa em tela. Este regresso ao norte fez-lhe muito bem e não seria de estranhar vê-la com uma Sophia dentro de meses.

Apesar de ter evitado ao máximo os spoilers, duvido que noutras leituras não fiquem a saber demasiado. Podem aproveitar os quase dois meses que faltam até à estreia para esquecer tudo. Evitem ao máximo o trailer e mesmo o videoclip de Daniela Galbin. A única coisa que precisam de saber, é que o título não presta e esconde o verdadeiro valor de uma magnífica produção nacional sobre alguns dos verdadeiros significados de amor. Qualquer coisa abaixo dos 70000 espectadores será uma injustiça. E antes que se queixem do preço dos bilhetes, acreditem que vão desperdiçar dinheiro em filmes bem piores do que este de forma perfeitamente consciente.

Título Original: "Pecado Fatal" (Portugal, 2013)
Realização: Luís Diogo
Argumento: Luís Diogo
Intérpretes: Sara Barros Leitão, Miguel Meira, Joao Guimarães, José Eduardo
Música: DJWild
Fotografia: Pedro Farate
Género: Drama, Romance
Duração: 90 min.
Sítio Oficial: http://pecadofatal.com

6 comentários:

Campos de Barros disse...

Tive a felicidade de assistir à estreia do filme e só posso afirmar que subscrevo por inteiro o comentário que acabei de ler...

Nuno disse...

Obrigado.

weeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee disse...

Atenção, a personagem femninina chma-se Liliana e não Sara. De resto, assisti á estreia e subscrevo, grande Filme.

Antestreia disse...

Ai, que o sono nos prega partidas! Ou melhor, "a personagem era tão real que a confundi com a actriz". Assim soa melhor :)
Obrigado pelo alerta.

Catarina Norte disse...

Terei que compensar a falha de não o ter visto no Fantas...confesso que foi mesmo o título que me afastou :( (por mais aleatório que isso seja..mas fiquei mesmo de pé atrás) E pela tua crítica, é bom saber que teremos essa possibilidade de nos reconciliarmos com o nosso cinema ;)

Nuno disse...

Vai ver Catarina. Foste a tanta coisa fraquinha que deixar escapar este até fica mal.