22 de março de 2010

"Alice in Wonderland" por Nuno Reis



Chapeleiro Louco: You used to be much more..."muchier." You've lost your muchness.

Muitas gerações começaram a ver cinema pelas mãos de Walt Disney e entre todos os filmes dos estúdios, "Alice in Wonderland" de 1951 foi dos que teve maior magia. Ou, como o adequado título diz, mais maravilhas. Passaram-se quase sessenta anos e estamos de volta ao mundo mágico da nossa infância. Ao contrário do que sucede a Alice não entramos pela porta mais pequena, mas pela grande: orçamento de milhões, tecnologia 3D, o realizador mais fantástico da actualidade e um lote de actores de primeira linha. Há duas pequenas diferenças: esta não é a mesma Alice, e Wonderland afinal é Underland.

Alice Kingsleigh é uma adolescente diferente das outras. A sociedade em que vive não a compreende e imagina que o destino de uma mulher é casar e ser feliz. Um pouco à semelhança do pai sempre conseguiu ver mais além e é frequente estar nas nuvens a pensar como seria voar, ou se os homens usassem saias e as mulheres usassem calças. No dia em que a pedem em casamento retira-se para pensar na proposta e vai dar ao mundo mágico com que sonhou toda a vida. Só que ela não se lembra de alguma vez lá ter estado, os habitantes não acham que ela seja a Alice deles, e caso seja a Alice certa... a rainha quer a cabeça dela.

Há um quase pré-requisito para ver este filme e é ter visto a animação de 1951. A queda de Alice para Underland é tão semelhante à do filme de animação que admitir à partida ser o mesmo mundo se torna obrigatório. Em Underland vamos reencontrar as personagens que recordamos desde então: o Coelho Branco, os gémeos Tweedledee e Tweedledum, o Gato de Cheshire, a sapiente lagarta Absolom e na mesa de chá estão a Lebre, o Chapeleiro e o rato (aqui mais aguerrido). Todos eles contam com a verdadeira Alice para os salvar da tirana Rainha de Copas e repor a Rainha Branca no poder.
O conto da jovem forasteira que reúne um bando sortido de descontentes para depor uma má governante é semelhante ao de Dorothy em Oz. Não sabe onde está, mas assume como prioridade fazer o bem aos outros. Esta Alice no entanto está um pouco renitente quanto a ser a paladina do Bem na Batalha da Dita. Afinal de contas, na era em que vive Joan d'Arc era considerada uma bruxa. Tal como a Peter Banning em "Hook" dizem-lhe que perdeu a muiticidade (muchness) e é isso que vai passar o filme todo a procurar. Vai-se tornar uma nova Alice, ousada e desafiadora, que sabe o que quer e como o conseguir.
O combate final era inevitável. O fio condutor aponta para ele tal como em todos os filmes comercialmente rentáveis do fantástico juvenil. Só que aqui foi reduzido ao máximo para maximizar a história como componente do filme e isso surpreende. Nessa cena é de destacar a pequena participação de Christopher Lee. Sendo assim torna-se também inevitável falar do desempenho dos actores fetiche do realizador. Podemos falar de Depp e Carter, ou ainda procurar a voz de Cough que se reformou e apenas trabalha para Burton. São elementos auxiliares de uma aventura que pertence a outra heroína. Bons actores, mas secundários. Já Wasikowska pela inexperiência em grandes papéis tem sempre o ar de perdida que era necessário. A surpresa é Crispin Glover como o vilão de serviço. Tem aqui uma das suas melhores personagens, ainda que seja muito ao estilo das anteriores. Anne Hathaway tem uma personagem tão enigmática que se acaba sem saber exactamente quem é esta rainha.

Para quem espera um filme de Tim Burton convencional aviso que não é aqui que o encontram. Apesar de todo o assombro visual digno de um mundo de fantasia não é nenhum "Beetlejuice". A história não foge ao previsível, mas vale pelos detalhes. Quem for a contar com um Burton sairá desiludido. Quem for de mente aberta e preparado para ser espantado tem aqui um filme que merece ser visto, a quaisquer dimensões. Só lhe falta um pouquinho mais de muiticidade.

Título Original: "Alice in Wonderland" (EUA, 2010)
Realização: Tim Burton
Argumento: Linda Woolverton (baseada nos livros de Lewis Carroll)
Intérpretes: Mia Wasikowska, Johnny Depp, Helena Bonham Carter, Anne Hathaway, Crispin Glover, Tim Pigott-Smith e as vozes de Michael Sheen, Alan Rickman, Timothy Spall, Stephen Fry
Fotografia: Dariusz Wolski
Música: Danny Elfman
Género: Aventura, Fantástico
Duração: 108 min.
Sítio Oficial: http://disney.go.com/disneypictures/aliceinwonderland/

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