Porquê MacBeth?
Em três dias consecutivos, as secções oficiais de Sitges apresentaram três adaptações de clássicos da literatura, o que permite reflectir não apenas sobre as relações da literatura com o cinema, mas sobretudo do interesse em produzir versões de três textos alvo de inúmeras leituras cinematográficas.
Afinal o que é adaptar ao cinema um texto literário? Será reinventar por completo uma obra como Dormael faz em
"Le Tout Nouveau Testament"? Será recriar e modernizar uma obra bicentária como o
"Frankenstein" de Bernard Rose? Ou será transpor com a maior fidelidade possível neste caso um texto teatral como "
MacBeth" dirigido por Justin Kurzel?
Confesso que sou mais sensível aos dois primeiros exemplos. "
MacBeth", de um realizador que está agora a fazer a adaptação do videojogo "
Assassin’s Creed" curiosamente com os mesmos actores, não assume o risco de inovar Shakespeare como por exemplo o fez Baz Luhrmann, e por isso, acaba-se sempre por comparar o seu trabalho com todas as inúmeras versões do Macbeth em cinema.
O que nos leva à reflexão sobre se vale a pena fazer remakes de filmes que contribuem muito pouco para novas visões. Classificado como Drama/Guerra, esta é uma redutora forma de publicitar esta obra-prima de Shakespeare. Nela o drama não aprofunda a dimensão trágica dos seus personagens e a guerra é apenas um adereço pouco significativo para a história. Poderíamos pensar que a base teatral de "
MacBeth" implica sobretudo uma valoração das interpretações. Mesmo aqui Michael Fassbender tem um registo pouco expressivo e Marion Cotillard passeia discretamente a sua beleza ao longo do filme. Se de entre as mais de cem adaptações de MacBeth, a compararmos com os filmes de Orson Welles ou de Kenneth Branagh, a questão de qual o interesse em readaptar "
MacBeth" torna-se ainda mais pertinente. Justin Kurzel também não resiste à tentação de copiar os grandes mestres como Kurosawa, Boorman ou Coppola com seus horizontes vermelhos. E copiar não se pode dizer que seja uma actividade muito criativa. Mesmo em termos de realização cinematográfica, cada vez mais assistimos a um predomínio dos grandes planos em detrimento de planos de conjunto. Até neste caso a televisão quer estandardizar o cinema.
Shakespeare já não recebe direitos de autor. Mas duvido que ficasse satisfeito com esta apropriação do seu universo trágico.
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