António Oliveira Salazar, Hélio Pestana e Ernesto Che Guevara, ou como os extremos se tocam.
A RTP, como sabido, organizou a versão portuguesa do concurso televisivo para escolher o maior (o que lá quer que isso seja) protagonista da história do país - no nosso caso, a escolha do Grande Português.
Ponto prévio: acho este concurso uma imbecilidade. Quer na versão francesa ou inglesa, onde se optou por uma atitude de entretenimento, ao invés (como a "nossa" televisão fez) caiu-se para o lado de levar este concurso para o informativo e sério. Essa primeira opção foi, claro, o primeiro erro. Já não basta colocarem no mesmo saco Eusébio, Amália, Vasco da Gama ou Fernando Pessoa, como nos perguntam qual destes foi o "maior" português.
O segundo erro foi Maria Elisa. Estamos habituados a ver a apresentadora / jornalista / adida da embaixada em momentos informativos sérios. Se a vemos a apresentar um programa, dito de entretenimento, não há milagres - a imagem de seriedade e importância do tema não descolam da apresentadora.
O terceiro erro foi excluírem daquela lista exemplificativa quer Salazar, quer Álvaro Cunhal. Porque deu uma imagem de afastamento da realidade histórica e de varrer o passado mais obscuro para debaixo do tapete do esquecimento - muitos hão-de ter votado nestes dois homens como castigo.
Mais tarde, surge a primeira lista, com os 100 mais da história portuguesa. E com ela, surgem alguns dos maiores disparates, estando no topo a pessoa (contra o qual absolutamente nada me move) de Hélio Pestana, actor de uma série infanto-juvenil da TVI, Morangos com Açúcar. É inenarrável o surgimento deste jovem actor - que chegou a parodiar com a situação - nesta lista. Conclusões que se poderiam tirar desta escolha: grande massa de população juvenil, mais rotinada no uso da internet, votou em Hélio, levando com ele nomes igualmente ridículos para a vontade que o programa anunciava. Quarto erro.
Mas o processo dispara para as pateticies finais, que culminam com a eleição de Salazar como o "maior português de todos os tempos". Em primeiro lugar escolhem os defensores das figuras finalistas - e encerram na mesma sala Odete Santos, Paulo Portas, Leonor Pinhão (por um lado) e Hélder Macedo, Jaime Nogueira Pinto ou Ana Gomes por outro. Figuras que desequilibraram o programa, quer pela solenidade que imprimiram à discussão, quer por (alguns) encarnarem uma quantidade apreciável dos piores defeitos lusitanos. E ainda, se o entretenimento pudesse continuar a ser defensável, fizeram-se directos de Braga, com intelectuais e pensadores a discorrerem sobre os personagens nomeados.
Até que chegamos ao passado Domingo, com o resultado conhecido. Juntam-se agora as vozes, bradando loas ou avisos, de que os saudosistas estão de volta, e de que "isto só vai ao sítio se viesse alguém como o professor". Mas, efectivamente, a votação terá pendido para onde o fez por 3 motivos. O primeiro é a pequena faixa de saudosistas da mão de ferro, filhos do Estado Novo que perderam benefícios para essa estupidez que é a democracia. Por outro lado, o tal afastamento de Salazar da lista inicial - "vamos mostrar-lhes que estamos presentes"!. E, por fim, mas como mais importante, o grosso dos votantes (que foram cinco vezes menos do que aqueles que votaram no concurso em outros países): a faixa etária mais jovem, que por um lado vota em Hélio Pestana, e por outro, chegados à votação final, pensam em Salazar muito ao estilo que muitos pensam em Che Guevara: não sabem muito bem quem foi, mas já que se vendem t-shirts com a cara dele, é porque marca uma posição. Marco uma posição, sou diferente. Salazar é o Che Guevara português. Votar em Salazar foi, para muitos, um acto de rebeldia, pop e kitsch ao mesmo tempo, marcando uma posição e demarcando-se do "rebanho". Não porque ele foi importante para o país, não porque ele foi o titular da pasta das finanças (sabem lá isso), simplesmente porque é diferente. Tenho uma estampa do revolucionário argentino, não porque conheço e defendo o seu ideal marxista de luta, mas sim porque é diferente. Afirmo-me por Che, afirmo-me por Salazar, voto na imbecilidade.
Ponto prévio: acho este concurso uma imbecilidade. Quer na versão francesa ou inglesa, onde se optou por uma atitude de entretenimento, ao invés (como a "nossa" televisão fez) caiu-se para o lado de levar este concurso para o informativo e sério. Essa primeira opção foi, claro, o primeiro erro. Já não basta colocarem no mesmo saco Eusébio, Amália, Vasco da Gama ou Fernando Pessoa, como nos perguntam qual destes foi o "maior" português.
O segundo erro foi Maria Elisa. Estamos habituados a ver a apresentadora / jornalista / adida da embaixada em momentos informativos sérios. Se a vemos a apresentar um programa, dito de entretenimento, não há milagres - a imagem de seriedade e importância do tema não descolam da apresentadora.
O terceiro erro foi excluírem daquela lista exemplificativa quer Salazar, quer Álvaro Cunhal. Porque deu uma imagem de afastamento da realidade histórica e de varrer o passado mais obscuro para debaixo do tapete do esquecimento - muitos hão-de ter votado nestes dois homens como castigo.
Mais tarde, surge a primeira lista, com os 100 mais da história portuguesa. E com ela, surgem alguns dos maiores disparates, estando no topo a pessoa (contra o qual absolutamente nada me move) de Hélio Pestana, actor de uma série infanto-juvenil da TVI, Morangos com Açúcar. É inenarrável o surgimento deste jovem actor - que chegou a parodiar com a situação - nesta lista. Conclusões que se poderiam tirar desta escolha: grande massa de população juvenil, mais rotinada no uso da internet, votou em Hélio, levando com ele nomes igualmente ridículos para a vontade que o programa anunciava. Quarto erro.
Mas o processo dispara para as pateticies finais, que culminam com a eleição de Salazar como o "maior português de todos os tempos". Em primeiro lugar escolhem os defensores das figuras finalistas - e encerram na mesma sala Odete Santos, Paulo Portas, Leonor Pinhão (por um lado) e Hélder Macedo, Jaime Nogueira Pinto ou Ana Gomes por outro. Figuras que desequilibraram o programa, quer pela solenidade que imprimiram à discussão, quer por (alguns) encarnarem uma quantidade apreciável dos piores defeitos lusitanos. E ainda, se o entretenimento pudesse continuar a ser defensável, fizeram-se directos de Braga, com intelectuais e pensadores a discorrerem sobre os personagens nomeados.
Até que chegamos ao passado Domingo, com o resultado conhecido. Juntam-se agora as vozes, bradando loas ou avisos, de que os saudosistas estão de volta, e de que "isto só vai ao sítio se viesse alguém como o professor". Mas, efectivamente, a votação terá pendido para onde o fez por 3 motivos. O primeiro é a pequena faixa de saudosistas da mão de ferro, filhos do Estado Novo que perderam benefícios para essa estupidez que é a democracia. Por outro lado, o tal afastamento de Salazar da lista inicial - "vamos mostrar-lhes que estamos presentes"!. E, por fim, mas como mais importante, o grosso dos votantes (que foram cinco vezes menos do que aqueles que votaram no concurso em outros países): a faixa etária mais jovem, que por um lado vota em Hélio Pestana, e por outro, chegados à votação final, pensam em Salazar muito ao estilo que muitos pensam em Che Guevara: não sabem muito bem quem foi, mas já que se vendem t-shirts com a cara dele, é porque marca uma posição. Marco uma posição, sou diferente. Salazar é o Che Guevara português. Votar em Salazar foi, para muitos, um acto de rebeldia, pop e kitsch ao mesmo tempo, marcando uma posição e demarcando-se do "rebanho". Não porque ele foi importante para o país, não porque ele foi o titular da pasta das finanças (sabem lá isso), simplesmente porque é diferente. Tenho uma estampa do revolucionário argentino, não porque conheço e defendo o seu ideal marxista de luta, mas sim porque é diferente. Afirmo-me por Che, afirmo-me por Salazar, voto na imbecilidade.
2 comentários:
Devo começar por dizer que não gostei nem do vencedor nem do segundo classificado. Achei mesmo muito triste que tenha sido eleito um ditador e um cadidato a. O programa em questão é criticável, naturalmente, como tudo é. Não votei por não me conseguir "achar" no meio daquela confusão Salazar-Eusébio-Fernando Pessoa-Vasco da Gama... Acho todavia que está a anos luz de (quase ?) toda a programação que passa em horário nobre (e não só), em termos intelectuais, na TV generalista. Claro que não foi nenhum tratado de história ou sociologia... Se fosse não tinha 300 000 pessoas a votar... Nem tão pouco a ver. Mas teve o mérito de por os portugueses a ouvir e apreender sobre muitos personagens relevantes da nossa história.
Em jeito de P.S., parabéns pelo blog.
Efectivamente, teve o condão positivo de informar um pouco sobre os personagens em causa... Obrigado pela visita!
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