5 de fevereiro de 2009

Medidas de segurança em excesso


Ontem vi algo inédito. O convite para "Doubt" indicava que material de gravação de imagens e som estava proibido de entrar na sala. É frequente em festivais estar situações acontecerem. Em Cannes ninguém entra no Mercado sem ter os sacos revistados e passados pelo detector de metais, uma vez em Sitges peguei no telemóvel para ver as horas e imediatamente um segurança me pediu que o guardasse. Em Portugal a única vez que me fizeram pedido semelhante foi no visionamento de imprensa de um Harry Potter. Considero situações normais quando o filme está nos primeiros visionamentos. Só que "Doubt" já vai com um mês de exibições pelo mundo fora. Procurando no Google logo o primeiro resultado de torrents diz que 65000 pessoas o estão a partilhar, muito provavelmente com melhor qualidade do que qualquer um conseguiria com a câmara de 3 Megapixeis.

Chegando ao cinema qual não é o meu espanto ao ver que há fila para entrar na sala. Confesso que cheguei em cima da hora, mas não era dito nada no convite acerca da hora de chegada. Apenas que a sessão teria início às 21:30. Junto-me aos incautos e aguardo pacientemente. Passados alguns minutos o número de pessoas atrás de mim continua a aumentar e à frente não se via avanços. Perguntei a um segurança se quem não tinha telemóvel podia entrar e diz-me que todos têm de ficar na fila. Passados uns minutos esse mesmo segurança vem dizer que quem não tiver telemóvel com câmara pode passar. Inacreditável!
Ao alcançar à porta o espectáculo era ainda melhor. Muito pessoal dos cinemas assistia, mas ninguém sabia bem o que fazer. Os funcionários entre guardar telemóveis em algo que me pareceram sacos numerados e ouvir reclamações não tinham mãos a medir. O segurança que fazia a detecção de metais ficou surpreso por me ver com carteira e chaves na mão, deve ter pensado que lhas ia atirar. Presumo que não soubesse trabalhar com aquilo. A detecção não acusou nada e mesmo assim o desconfiado perguntou-me se trazia algum gravador. Depois da espera só me apetecia ser irónico, mas como preferia ver o filme a ser retido para averiguações disse um simples não.
Ao entrar na sala fico em choque pois já umas 300 pessoas estavam lá dentro. Se tiverem demorado com elas o mesmo tempo que estavam a demorar com os que ainda estavam do lado de fora deviam estar a entrar desde a hora de almoço. Os comentários gerais não se afastavam muito do "vou começar a gravar com a câmara que trouxe no sapato".
O filme começou com um atraso pequeno, mas o detestável intervalo voltou a aparecer. Como por causa de todo o aparato não tinha levado o meu gravador para registar as primeiras impressões tive de o fazer à moda antiga: papel + caneta = gatafunhos incompreensíveis. Felizmente a maior lição que tive de jornalismo foi que um jornalista anda sempre com uma esferográfica.

Fica uma pergunta no ar. O que se terá passado para que procedam assim? Não seria mais simples divulgarem o que se passou com o prevaricador caso exista (ou um boato caso não haja nenhum) como forma de desmotivação? É para isso que existe um intervalo publicitário antes de cada filme.

Pontos fundamentais para visionamentos controlados


Isto sucedeu num cinema Zon, mas mais cedo ou mais tarde vai ser igual em todos. O alerta fica deixado para todas as distribuidoras e salas:

  • Não é bem visto suspeitar das pessoas. Façam-no apenas quando se justifica (quando o filme ainda não está na net).
  • Se querem fazer recolha de telemóveis, detecção de metais e tudo o mais façam-no com pessoal treinado e despachado. Pelo preço certo até posso dar a formação.
  • Para desmotivar os cameramen amadores que estejam na sala cumpram a ameaça e estejam com óculos infravermelhos na sala. Não incomoda ninguém e é mais agradável do que estar na fila meia hora. Assim a única mensagem que passa é que ir ver um filme de graça dá demasiado trabalho.
  • Os vencedores de convites são em 90% dos casos pessoas com contactos nos sítios certos que vão a dois filmes por semana ou participantes vitalícios de passatempos de jornais/rádio/blogs que ganham algo de quinze em quinze dias no nome dos próprios(as), dos irmãos(ãs) ou namorados(as). Nenhum deles interessado em perder o privilégio. Dá menos trabalho a todos dizer "quem for apanhado a gravar sons ou imagens ficará proibido de entrar num cinema por 5 anos" ou melhor ainda "quem detectar actividades ilícitas na sala ganha 10 bilhetes grátis".

    Para o espectador:
  • O controlo não é tão rigoroso como a entrada num estádio ou concerto, imaginem que vão embarcar num avião. Quem só vai ao shopping para o filme escusa de levar telemóvel, deixe-o em casa. Se tiver de levar deixe-o escondido no carro. Evitem objectos metálicos e não transportem volumes suspeitos (sacos do hipermercado, pochettes ou malas de senhora). Ao chegarem ao segurança levem objectos metálicos como chaves e porta-moedas na mão. Telemóveis e gravadores desligados e prontos a ir para o saco. Pequenas coisas que facilitam a vida de todos.
  • 6 comentários:

    Carlos Martins disse...

    E queixam-se de falta de público?
    Vai ser com estas medidas que o recuperam?

    Sinceramente, se fosse comigo tinha pedido o livro de reclamções (só para os chatear e dar trabalho) e depois vinha embora e nunca lá mais punha os pés.

    Por muito que adore o cinema, estou no limite da paciência para começar a ver todos os filmes sempre em casa - nem que tenha que fazer upgrade da tv de 50" para uma tela de 150"!

    Agora... como se já não bastasse ser tratado como bandido sempre que se quer ver um DVD original (e gramar com pub e avisos do FBI - que por cá nem manda nada!) ser tratado de igual forma num cinema... para mim será a gota de água!

    Nuno disse...

    Carlos, percebo que a opinião geral seja essa. Pessoalmente cada vez fico mais viciado em cinema e não é assim que me desmotivam.

    O convite alertava que o acesso seria assim, só foi quem quis. Algumas vezes fará sentido.
    Só acho que este não foi o melhor filme para começar e não adoptaram as medidas mais correctas.

    Bruno Ramalho disse...

    este não foi de todo o filme certo para o fazerem! E só concebo uma coisa destas para o grande público em geral numa estreia mundial em simultâneo, como o Matrix há uns anos atrás... tudo o resto são palhaçadas que só incomodam os clientes e não trazem resultados nenhuns para qualquer situação que eles estejam à espera de corrigir (como se fosse possível).

    Tiveste muita paciência Nuno, digo-te já. :)

    Carlos Martins disse...

    Eu não posso concordar nunca com estas medidas, já que... está mais que provado que são completamente ineficazes.

    Tome-se como exemplo o caso do The Dark Knight, onde eles andaram a controlar rigorosamente todas as cópias disponíveis, com toda a tecnologia ao dispôr... e o resultado foi o que se viu.

    Não posso concordar com que se abuse de centenas ou milhares de pessoas com a desculpa de que uma delas "poderá" ter um telemóvel que grave vídeo.

    Medidas de segurança "não-intrusivas", ainda vá lá... agora isto assim, determinantemente NÃO.

    E para que não haja dúvidas, eu não deixo de adorar o cinema... passo é a não gostar da "indústria" que se lembra destas infelizes ideias cada vez mais.

    Jubylee disse...

    Também reparei nessa notinha de rodapé no convite - lembrei-me logo dos visionamentos para críticos. Mas também achei estranho, visto que o filme já tinha estreado no estrangeiro há algum tempo e era óbvio que já devia estar na net. Como optei por ir ver outra ante-estreia nesse dia não me sujeitei a tal situação, mas ia-a achar um tanto ridícula, pois fez-me lembrar a entrada controlada em algumas discotecas...enfim...acho que os teus conselhos são muito pertinentes.

    Ógnito Inc. disse...

    Na minha opinião perante este tipo de atitude só há uma resposta. Vir embora. Sala vazia. Nos dias seguintes, crítica do filme nos media: vazio.