Se já passaram décadas desde que o III Reich capitulou, a verdade é que a Segunda Guerra Mundial continua a ser um filão aparentemente interminável de ideias e histórias para a realização de um filme. Por causa dela, já vimos de tudo, desde épicos sobre o conflito completo, até episódios centrados em pequenos eventos. O veículo escolhido tem sido o do cinema, mas não nos olvidamos com bastante certeza da qualidade evidenciada na mini-série "Irmãos de Armas," uma tremenda produção de Steven Spielberg.
Em "O Rapaz do Pijama às Riscas" acompanhamos a vida do pequeno Bruno (Asa Butterfield), filho de um recentemente promovido comandante nazi, cuja nova missão obriga a sua família a abandonar Berlim e ir viver para uma luxuosa casa num idílico ambiente campestre. Com ele segue viagem a mãe (Vera Farmiga), a irmã Gretel (Amber Beattie) e a empregada mais chegada da família, Maria (Cara Horgan). A casa encontra-se edificada paredes meias com um campo de concentração (que será com toda a certeza o de Auschwitz-Birkenau), que se encontrava no auge do labor com vista a atingir a chamada Solução Final.
Claro está que nós, como os soldados das Waffen-SS, sabemos perfeitamente o que se passa no dentro daquele terreno rodeado de arame farpado electrificado. Mas Bruno não. Para ele, não passa de uma estranha quinta com agricultores de pijama. Até que um dia, impulsionado pela curiosidade, decide explorar as traseiras da casa, até dar de caras com a dita rede e, especialmente, com Shmuel (Jack Scanlon), uma criança judia aprisionada no campo. Mas, para Bruno, não passa da descoberta de um novo e estranho amigo que anda todo o dia de pijama: “Why do you wear pajamas all day?”, questiona o jovem berlinense. “The soldiers. They took all our clothes away”, replica o encarcerado, resignado, que recebe a resposta guardada no baú da infantilidade - “my dad's a soldier, but not the sort that takes people's clothes away”. O pai (uma boa interpretação de David Thewlis), claro está, é o director do campo de concentração.
Bruno cria então laços da amizade com o inimigo, “We're not supposed to be friends, you and me. We're meant to be enemies. Did you know that?”, enquanto a mãe se apercebe lentamente do verdadeiro caminho que está a ser travado na guerra. O seio familiar começa degradar-se paulatinamente, culminando num trágico desfecho para todos.
O Rapaz do Pijama às Riscas, baseado na obra homónima do irlandês John Boyne, surge-nos pela mão do britânico Mark Herman, vencedor da Semana dos Realizadores no Fantasporto 2001, com "Purely Belter", numa produção repartida entre os EUA e o Reino Unido. Assente em premissas bem definidas, em especial na reconstituição dos cenários de época, falha desde o minuto um na estranha opção de uma história centrada na Alemanha e na Polónia, ser falada em inglês com uma carregada pronúncia britânica. Ainda que se defenda a incapacidade natural do grande público para assistir a filmes com legendas, a verdade é que essa incapacidade vai navegar para a credibilidade da narrativa, que fica desde logo vergada ao óbice de termos Picadilly Circus exportada para os arredores de Auschwitz. Nada a atacar, como é óbvio, à interpretação do jovem Asa Butterfield, que mais uma vez mostra a capacidade formativa das escolas de cinema daquela Ilha. Mas retira profundidade logo à partida, ainda mais quando é um filme constantemente comparado a "A Vida é Bela "de Roberto Begnini, este a encontrar-se num patamar acima, essencialmente por encarnar em si uma aura neorealista, na melhor esteira italiana. Ao contrário, o filme de Herman nunca se solta das amarras ficcionais, ficando o filme emparedado numa falsa moral, refém da estranha oralidade em que se baseia, mas que solidifica a final na opção de subverter a tragédia lato sensu numa tese (demasiadamente) moralista. Louve-se o realizador de não cair no facilitismo de alterar o rumo final do romance, mas acaba por ser mais uma obra simpática do oceano da II Grande Guerra.
Título Original: "The Boy in the Striped Pyjamas" (Reino Unido / EUA, 2008) Realização: Mark Herman Argumento: Mark Herman e John Boyne Intérpretes: Asa Butterfield, David Thewlis e Vera Farmiga Fotografia: Benoît Delhomme Música: James Horner Género: Drama / Guerra Duração: 94 min. Sítio Oficial: http://www.boyinthestripedpajamas.com |
2 comentários:
É isso mesmo. Uma história simpática que não cai no facilitismo e apresenta uma perspectiva diferente do Holocausto. Dar-lhe-ia 4/5. Pena que não tenham explorado muito bem a amizade entre as duas crianças.
Um filme regular! Obrigado pela visita. Um abraço
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