12 de março de 2012

"Hugo" por Nuno Reis

A lenda de Méliès

Esta é a história de Hugo Cabret. Orfão e negligenciado pelo tio, o único familiar vivo, passa os seus dias nas paredes da estação dos comboios. A sua prioridade é manter os relógios em funcionamento para que ninguém decida entrar nesse mundo secreto. A sua verdadeira missão é mais complicada. Tem de concluir um autómato que o pai encontrou num museu e que escreverá algo de muito importante. Convencido que esse autómato lhe transmitirá a derradeira mensagem do pai, não poupa esforços para o ligar. Mas precisa de muitas peças e de uma misteriosa chave.
Se os relógios são colocados de forma a serem vistos por todos, é também verdade que são capazes de ver todos. Lá dentro Hugo vê tudo e conhece bem as pessoas habituais da estação. Lojistas e funcionários dos caminhos-de-ferro, todos são observados sem que o desconfiem. De todos eles o que mais importa evitar é o chefe da estação, famoso por enviar pequenos pedintes esfomeados para o orfanato, e o que mais interessa investigar é o velhote da loja de brinquedos, um mundo mágico de engrenagens bastante úteis para quem quer reparar uma máquina. Com a ajuda de Isabelle, outra pequena que anseia por uma aventura, vai descobrir um segredo maior do que imaginavam.

Há duas informações básicas sobre cinema que todos devem conhecer. A primeira é que ele se tornou popular com os irmãos Lumiére. A segunda é que ele se tornou eterno graças à mente criativa de Georges Méliès. Se os Lumiére com o objectivo do lucro imediato o espalharam por todo o país como uma curiosidade e sem explorar o verdadeiro potencial, a verdade é que a veia artística de outros franceses lhe deu o potencial para se tornar na arte suprema. E isso começou com Méliès. Foram a magia e sua paixão pela ilusão que o levaram a exigir mais daquela curiosidade e a fazer o impossível. A ele devemos tanto daquilo que o cinema é hoje que nunca poderemos pagar, mas este filme é um bom esforço. Aliás, quem quiser educar um filho na magia do cinema tem aqui uma excelente forma de começar pois não só “Hugo” tem todo o encanto de um filme infantil, como ajuda a perceber as diferentes formas de ver cinema ao lono dos anos. Seja com medo, com admiração ou com paixão, não é suposto uma projecção deixar alguém indiferente e benditos sejam aqueles que trabalham para tornar os sonhos em realidades.

Este filme foi apelidado de pesadelo em termos de marketing por não ter um género definido. É infantil e é para gente crescida, não sendo normal também não é correcto classificar como fantástico... Pois então esqueçam os rótulos! Digamos apenas que é um filme para ser visto por quem gosta de cinema. Todas as referências dos pioneiros do cinema francês e americano estão lá.
Scorsese há dezoito anos que não fazia um filme abaixo desse escalão etário. Por especial insistência da filha adaptou-se ao cinema infantil com excelentes resultados. Nota-se por vezes um tom condescendente na forma de filmar, adaptando a reverência aos velhos mestres a um público que não sabe ver cinema centenário, mas depois de um enorme plano sequência tridimensional logo na abertura, perdoa-se qualquer desvio que faça na excelência. O seu “Hugo” pode não ser absolutamente mágico nem ter total rigor histórico, mas para os miúdos será certamente um prazer para assistir na companhia de quem souber explicar tudo o que se passa. Sem isso pelo menos ficarão a saber que cada um de nós tem o seu lugar nesta máquina gigante.

HugoTítulo Original: "Hugo" (EUA, 2011)
Realização: Martin Scorsese
Argumento: John Logan (livro de Brian Selznick)
Intérpretes: Asa Butterfield, Chloe Grace Moretz, Ben Kingsley, Sacha Baron Cohen, Emily Mortimer, Helen McCrory, Jude Law, Ray Winstone
Música: Howard Shore
Fotografia: Robert Richardson
Género: Aventura, Drama, Família, Mistério
Duração: 126 min.
Sítio Oficial: http://www.hugomovie.com/

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