O cinema como salvação
Os filmes sobre Cinema têm vindo a ganhar força nos últimos anos. Não costumam é ser dedicados a maus filmes. “Argo” era um terrível argumento do período pós-Star Wars e nunca foi filmado. No entanto, em 2012 fazem um filme com o mesmo título sobre a pré-produção e é justamente apontado como um dos grandes filmes do ano. Como pode um filme sobre um mau filme ser bom? É que “Argo” não é sobre um mau filme, é sobre um não-filme, e porque esse não-filme foi feito para salvar vidas.
Já sabíamos que um filme suficientemente mau se torna bom. Esta é a história de como uma ideia tão má que não podia ser verdade, se revelou a melhor possível.
Contexto histórico: O Irão passou os anos setenta sob domínio americano indirecto. O seu Xá era um ditador ao serviço dos capitais estrangeiros e o povo vivia na miséria. Uma revolução bastou para o depor e colocar o líder religioso Ayatollah Khomeini no poder só que os EUA, cumprindo as suas obrigações, acolheram o aliado moribundo. Os iranianos, profundamente descontentes com isso, exigiram a extradição do anterior líder para julgamento, que serviria para condená-lo à morte. Como os americanos se revelaram intransigentes, o povo ocupou a embaixada sequestrando todos os seus ocupantes. Seis conseguiram escapar. Após dois meses de exigências de parte a parte, começaram a ser pensados planos para os tirar de lá. O melhor era um pouco suicida: dar-lhes bicicletas e mapas para percorrerem 500 kilómetros até uma fronteira pouco guardada. Por isso o especialista da CIA em extracções decidiu pensar num plano menos mau. O melhor que lhe ocorreu foi fazer um falso filme.
Quem anda atento à indústria cinematográfica sabe que a imprensa especializada está constantemente a anunciar projectos que jamais verão a luz do dia. Para os americanos em casa "Argo" seria mais um desses. Para os refugiados na casa do embaixador canadiano seria o tudo ou nada.
O que distingue o "Argo" de Ben Affleck de 99% dos filmes americanos é dizer à partida que os EUA têm culpa no processo. Assume ter causado interferências no processo democrático dos povos com petróleo e admite responsabilidade dos seus aliados por atentados aos direitos humanos. Mostra o Irão como um povo selvagem, mas justifica-o pois era um período de transição e o fim de um regime terrível (não que o seguinte fosse melhor, mas na altura não o sabiam). Com um início assim, o filme conquista logo a simpatia. E no final reconhece que a América do Norte tem outro país. Com tantos canadianos infiltrados nos EUA e campeonatos desportivos comuns, a divisão entre os dois é pouco clara, especialmente porque o de sul tem um ego enorme. Ver esta sentida homenagem ao povo irmão do norte dá vontade de aplaudir.
E há mais! Na abertura é dada uma lição abreviada de história ao espectador. Recorre desde logo à linguagem cinematográfica causando algum espanto em quem esperava um filme mais convencional. Mas "Argo", estou a demonstrar, não é um filme como os outros. Este é um em vários exemplos de uma enorme atenção aos detalhes. Só contamos verdadeiramente uma história se contarmos tudo e "Argo" vai fazê-lo. A dolorosa verdade é uma característica dos filmes do produtor George Clooney.
Um dos favoritos a Oscares nesta recta final do ano, basta ver quem trata da fotografia e banda sonora, permitirá ver como Ben Affleck se está a metamorfosear. De galã sem jeito, para protagonista de filmes de acção e finalmente herói nacional, está salvo como actor. Fora das câmaras junta o Oscar de argumentista a um currículo que o nomeará mais cedo ou mais tarde na categoria de realizador. Tudo mais do que boas razões para ver em cinema o caso desclassificado que faz parte do manual de qualquer agente secreto. Aproveitem que, com as novas ferramentas de comunicação, esta desculpa não pode ser reutilizada.
Os filmes sobre Cinema têm vindo a ganhar força nos últimos anos. Não costumam é ser dedicados a maus filmes. “Argo” era um terrível argumento do período pós-Star Wars e nunca foi filmado. No entanto, em 2012 fazem um filme com o mesmo título sobre a pré-produção e é justamente apontado como um dos grandes filmes do ano. Como pode um filme sobre um mau filme ser bom? É que “Argo” não é sobre um mau filme, é sobre um não-filme, e porque esse não-filme foi feito para salvar vidas.
Já sabíamos que um filme suficientemente mau se torna bom. Esta é a história de como uma ideia tão má que não podia ser verdade, se revelou a melhor possível.
Contexto histórico: O Irão passou os anos setenta sob domínio americano indirecto. O seu Xá era um ditador ao serviço dos capitais estrangeiros e o povo vivia na miséria. Uma revolução bastou para o depor e colocar o líder religioso Ayatollah Khomeini no poder só que os EUA, cumprindo as suas obrigações, acolheram o aliado moribundo. Os iranianos, profundamente descontentes com isso, exigiram a extradição do anterior líder para julgamento, que serviria para condená-lo à morte. Como os americanos se revelaram intransigentes, o povo ocupou a embaixada sequestrando todos os seus ocupantes. Seis conseguiram escapar. Após dois meses de exigências de parte a parte, começaram a ser pensados planos para os tirar de lá. O melhor era um pouco suicida: dar-lhes bicicletas e mapas para percorrerem 500 kilómetros até uma fronteira pouco guardada. Por isso o especialista da CIA em extracções decidiu pensar num plano menos mau. O melhor que lhe ocorreu foi fazer um falso filme.
Quem anda atento à indústria cinematográfica sabe que a imprensa especializada está constantemente a anunciar projectos que jamais verão a luz do dia. Para os americanos em casa "Argo" seria mais um desses. Para os refugiados na casa do embaixador canadiano seria o tudo ou nada.
O que distingue o "Argo" de Ben Affleck de 99% dos filmes americanos é dizer à partida que os EUA têm culpa no processo. Assume ter causado interferências no processo democrático dos povos com petróleo e admite responsabilidade dos seus aliados por atentados aos direitos humanos. Mostra o Irão como um povo selvagem, mas justifica-o pois era um período de transição e o fim de um regime terrível (não que o seguinte fosse melhor, mas na altura não o sabiam). Com um início assim, o filme conquista logo a simpatia. E no final reconhece que a América do Norte tem outro país. Com tantos canadianos infiltrados nos EUA e campeonatos desportivos comuns, a divisão entre os dois é pouco clara, especialmente porque o de sul tem um ego enorme. Ver esta sentida homenagem ao povo irmão do norte dá vontade de aplaudir.
E há mais! Na abertura é dada uma lição abreviada de história ao espectador. Recorre desde logo à linguagem cinematográfica causando algum espanto em quem esperava um filme mais convencional. Mas "Argo", estou a demonstrar, não é um filme como os outros. Este é um em vários exemplos de uma enorme atenção aos detalhes. Só contamos verdadeiramente uma história se contarmos tudo e "Argo" vai fazê-lo. A dolorosa verdade é uma característica dos filmes do produtor George Clooney.
Um dos favoritos a Oscares nesta recta final do ano, basta ver quem trata da fotografia e banda sonora, permitirá ver como Ben Affleck se está a metamorfosear. De galã sem jeito, para protagonista de filmes de acção e finalmente herói nacional, está salvo como actor. Fora das câmaras junta o Oscar de argumentista a um currículo que o nomeará mais cedo ou mais tarde na categoria de realizador. Tudo mais do que boas razões para ver em cinema o caso desclassificado que faz parte do manual de qualquer agente secreto. Aproveitem que, com as novas ferramentas de comunicação, esta desculpa não pode ser reutilizada.
Título Original: "Argo" (EUA, 2012) Realização: Ben Affleck Argumento: Joshuah Bearman (baseado no artigo de Chris Terrio) Intérpretes: Ben Affleck, Bryan Cranston, Alan Arkin, John Goodman, Victor Garber, Tate Donovan, Clea DuVall, Scoot McNairy, Rory Cochrane, Christopher Denham, Kerry Bishé, Kyle Chandler, Chris Messina Música: Alexandre Desplat Fotografia: Rodrigo Prieto Género: Drama, História, Thriller Duração: 120 min. Sítio Oficial: http://argothemovie.warnerbros.com/ |
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