18 de novembro de 2012

"Detachment" por Nuno Reis

Vivemos um período conturbado da nossa história. O presente está negro e as perspectivas de futuro não são melhores. No meio de tantos problemas, aquelas questões que nos deviam incomodar há muito, ficaram como que esquecidas. As mais perturbadoras são as que têm impacto na nossa velhice como a segurança social não querer acarretar com as despesas de saúde e não ter dinheiro para as reformas, mas mais importante do que a nossa velhice ou o nosso futuro como nação, é o nosso futuro como espécie. Há problemas que afectam toda a humanidade e esse devem ser combatidos em primeiro lugar. Não falo de combater a fome e as doenças ou proteger o ambiente, esses são temas que nunca saem das agendas. Falo de preparar uma geração capaz de substituir a antecessora perante desafios maiores. Falo da educação que quanto mais se nota como necessária, mais se sente maltratada.

Tony Kaye é daqueles realizadores sem medo de falar dos tabus. Da mesma forma que no brilhante "American History X" alerta para uma geração sem valores, agora previne-nos - demasiado tarde - para uma geração sem rumo. Reuniu um elenco surpreendente para esta produção independente. Marcia Gay Harden, Lucy Liu, Tim Blake Nelson, Christina Hendricks e Blythe Danner são alguns dos indivíduos que sobrevivem a muito custo a cada dia. James Caan é um farol de esperança que evita o afundar daquele corpo docente, e Adrien Brody é o professor substituto que vai estar lá por um mês e acaba por despoletar a mudança. Não adianta revelar mais sobre cada um deles. São professores a enfrentar alunos desinteressados, pais irresponsáveis, e pior, um ministério com orientações para conseguir resultados forjados em vez de exigir pessoas formadas. O resultado de tudo isso é gritado no filme: alunos com tudo preparado para passarem sem saber e sem esforço, serão adultos sem ambição. Oitenta por cento da população americana trabalhará pelo ordenado mínimo em empregos horríveis, terá uma vida infeliz e miserável, apenas porque nem pais nem governo se preocuparam com eles, nem deixaram que os professores se preocupassem. Pelo contrário, quiseram convertê-los em mais uma ferramenta do facilitismo.

A chegada de Barthes (Brody) vai mudar isso. Como professor temporário já conheceu muita gente. Aprendeu a lidar com todo o tipo de alunos. E mais importante, como não tem os objectivos estanques dos professores permanentes, ainda acredita que pode fazer a diferença. Há imensos filmes sobre o tema. A diferença em "Detachment" é que vemos Barthes também fora da escola a ser aquilo que é entre muros: uma pessoa que se preocupa com o próximo e incapaz de assistir de forma indiferente a vidas desperdiçadas. E além disso, como todos os professores, a ter os seus próprios problemas delicados e urgentes, que seriam uma justificação para um trabalho desleixado caso não fosse um herói dos tempos modernos, encarando os obstáculos que a vida lhe coloca como espera que os seus alunos o façam.

Para muitos este filme pode ou passar ao lado, ou parecer um exagero ou pode ser um murro no estômago. Não deixará de ser bom. Mais do que um grande filme, é o agradecimento tardio da sociedade pelo que alguns grandes profissionais estão a fazer no dia-a-dia. Continuem assim. Se cada um salvar um aluno por ano ainda podemos ter esperanças na próxima geração.
DetachmentTítulo Original: "Detachment" (EUA, 2011)
Realização: Tony Kaye
Argumento: Carl Lund
Intérpretes: Adrien Brody, Sami Gayle, James Caan, Betty Kaye, Christina Hendricks, Lucy Liu, Marcia Gay Harden, Tim Blake Nelson, William Petersen, Blythe Danner, Bryan Cranston
Música: The Newton Brothers
Fotografia: Tony Kaye
Género: Drama
Duração: 97 min.
Sítio Oficial: http://detachment-film.com/

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