8 de junho de 2008

"Youth Without Youth" por Nuno Reis


O homem que dominou os anos setenta do cinema com clássicos incontornáveis como "The Godfather" e "Apocalypse Now" andava afastado da realização e da escrita. Como produtor manteve-se activo, com alguns bons filmes de horror - "Sleepy Hollow", "Jeepers Creepers" - e todos os trabalhos da filha, mas foram precisos dez anos para Coppola - o original – voltar a fazer aquilo em que é melhor: realizar. O responsável por esse regresso foi Mircea Eliade, um dos maiores pensadores romenos do século XX. Em 1976 Eliade usou a sua experiência em filosofia indiana e recordações da presença nazi na Roménia para escrever um pequeno livro e o juntar a uma extensa bibliografia de variados géneros. "Youth Without Youth", o filme, tornou-se assim também uma homenagem póstuma a um autor que o mundo não pode esquecer.

Dominic é um velho professor de linguística que caminha despreocupado e é subitamente atingido por um relâmpago. Não só sobrevive miraculosamente como tem uma espantosa recuperação e rejuvenesce. Ajudado pelo Doutor Stanciulescu vai estudar a sua nova condição e o potencial latente da sua mente. Quando a fama o torna alvo de cobiça de médicos de toda a Europa terá de fugir dos nazis e emigrar para a Suíça onde, sob um nome falso, continuará a sua obra sobre as origens da linguagem. O relâmpago causa simultaneamente uma genialidade disfarçada e uma loucura contida. Ao longo dos anos Dominic consegue tornar-se numa mente brilhante que tem de limitar a informação que liberta, mas também ganha poderes que transcendem em muito as capacidades actuais de um ser humano e proclama-se homo superior. Mas aí é novamente sujeito à mais bela e terrível condição humana, ser feito para amar.

Aos actores foi pedido que se superassem. Tim Roth transmite medo, confiança, angústia e sabedoria, e é brilhante em qualquer das personalidades. Bruno Ganz é um talento desperdiçado, tem uma personagem fulcral da história e espalha a sua classe, mas merecia muito mais. Depois da desilusão que é a pequena participação de Ganz surge outra grande actriz escondida numa pequena personagem. Alexandra Maria Lara como Laura tem um papel desolador, muito inferior ao que seria esperado, mas quando entra em cena como Veronica supera todas as expectativas. A interpretação com que nos presenteia é tão absorvente que ninguém consegue dividir o ecrã com ela. E também aqui a riqueza na expressão facial é suficiente para adivinhar uma completa mudança de personalidade ou um pensamento.
A fotografia é belíssima, a realização magnífica e os cenários totalmente condizentes com a acção. O argumento é a parte mais desafiadora por apresentar teorias intrigantes e por terminar de forma muito indefinida. Fica para o espectador a responsabilidade de perceber o que esteve a ver durante duas horas, mas também de reflectir sobre o verdadeiro significado da vida.

É um trabalho de Coppola feito pelo próprio e para o próprio. A liberdade dada por ter a única palavra na escrita do argumento, na realização e na produção faz com que não seja um filme comercial. É cinema apenas pelo gosto de fazer cinema. E é assim que sabe melhor.

Título Original: "Youth Without Youth" (Alemanha, EUA, França, Itália, Roménia, 2007)
Realização: Francis Ford Coppola
Argumento: Francis Ford Coppola baseado no livro de Mircea Eliade
Intérpretes: Tim Roth, Alexandra Maria Lara, Bruno Ganz
Fotografia: Mihai Malaimare Jr.
Música: Osvaldo Golijov
Género: Drama, Romance, Thriller
Duração: 124 min.
Sítio Oficial: http://www.ywyfilm.com/

2 comentários:

Queirosene disse...

Parabéns pelo blog, faz parte da leitura diária indispensável.
Eu daria 5 estrelas a este filme. Além de tudo o que escreveu no seu texto, acho que há uma genialidade de realização e interpretação - sobretudo pelo Tim Roth - neste filme. Surpreendeu-me e muito. Saudações.

Nuno disse...

O filme também me surpreendeu e é com muito gosto que o irei rever assim que possível. O final ainda me está a perturbar...

Obrigado pelos elogios e pelas visitas.